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    Análise: Jacques Le Goff mudou olhar de acadêmicos sobre Idade Média

    JOÃO BATISTA NATALI
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    02/04/2014 03h08

    O historiador Jacques Le Goff foi um dos mais influentes intelectuais do século 20. Por meio de seus livros e da revista "Annales", transformou o olhar do meio acadêmico sobre a Idade Média.

    Le Goff, autor de livros como "Uma Breve História da Europa", seguiu o caminho aberto, na França, pelos historiadores Marc Bloch e Lucien Febvre, que desde o final da década de 1920 trilharam uma via intermediária para o estudo da história.

    Não se tratava mais de alinhavar biografias edificantes que pudessem servir moralmente de exemplo para o homem contemporâneo (os santos dentro do catolicismo, por exemplo) ou então, e na esteira do marxismo, de colocar em primeiro plano a economia e estudar os conflitos gerados pela escassez.

    Roger-Viollet/AFP
    O historiador francês Jacques Le Goff, em 1988
    O historiador francês Jacques Le Goff, em 1988

    O grupo dentro do qual Le Goff surgiu, também chamado "Nova História", valorizava as mentalidades, incorporava a antropologia à leitura de velhos manuscritos, identificava hierarquias paralelas ao esfacelado poder político medieval. As pertinências das pesquisas se deslocavam.

    No livro "Os Intelectuais na Idade Média" (1957), por exemplo, estudou o cotidiano estudantil no século 13 e não os teólogos influentes naquela época.

    SISTEMAS ORIGINAIS

    Com Le Goff, a Idade Média deixou de ser vista como um longo período que colocou o progresso entre parênteses e, com suas supostas "trevas", serviu apenas de penoso caminho da humanidade na direção do Renascimento.

    O historiador não apenas fazia uma espécie de arqueologia das mentalidades que coexistiam na Europa. Ele também as considerava sistemas originais, das quais o século 16 e o mercantilismo seriam bons herdeiros.

    Abordou os banqueiros, o dinheiro, as percepções diferenciadas de Deus, o nascimento do purgatório dentro do cristianismo ou a relação entre os santos, reis e heróis.

    Uma exceção nessas pinceladas de cores múltiplas foi sua biografia "São Luís" (1996), porque Luís, como rei da França, gerou imagens poderosas que enriqueceram e nutriram a mentalidade do homem medieval.

    Nascido em Toulon, era filho de um professor secundário e militante anticlerical. Passou em 1945 o concurso de ingresso à Escola Normal Superior —que forma a elite docente francesa— e, já como historiador, interessou-se pela temática medieval. Pesquisou arquivos em Praga, Roma ou Oxford.

    Foi um dos protegidos do historiador francês Fernand Braudel (1902-1985), que o convidou para ser bolsista da Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais, da qual foi diretor entre 1972 e 1977.

    Fortaleceu essa instituição um tanto órfã no organograma do ensino superior e da pesquisa francesa, espremida entre as universidades e as grandes escolas, como a "Normale Sup".

    Para um país polarizado politicamente, Le Goff nunca deixou de ser um homem de esquerda. Tinha ojeriza pelo Partido Comunista e pela União Soviética. Dizia-se socialista e, nos anos 1960, chegou a se filiar ao PSU (Partido Socialista Unificado), cisão à esquerda do atual Partido Socialista.

    Editoria de Arte/Folhapress
    Principais livros de Jacques Le Goff publicados no Brasil
    Principais livros de Jacques Le Goff publicados no Brasil

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