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    Filmes usam fórmulas diferentes para falar sobre aliens

    DENNIS OVERBYE
    DO "THE NEW YORK TIMES"

    14/07/2014 13h48

    Quando eu era criança, o filme mais assustador da época se chamava "Os Invasores de Marte", que contava a história de uma invasão alienígena a partir do ponto de vista de um menino. Ele foi lançado em 1953, quando minha vida toda girava em torno do campo de beisebol construído pelos pais do bairro onde eu morava, no terreno baldio que ficava em frente à minha casa.

    Durante uma noite de tempestade, o menino do filme, Danny, observa o céu pela janela de seu quarto e vê um disco voador mergulhando no chão. Uma série de vórtices começa a aparecer, sugando as pessoas para dentro da terra, onde bolinhas do tamanho de ervilhas são colocadas nas cabeças das vítimas, que são transformadas em robôs, incluindo —e isso me deixava apavorado— o próprio pai de Danny.

    Meus pais não quiseram me levar ao cinema para assistir ao filme, mas os trailers já me deixavam morrendo de medo. Depois do jantar, eu ficava no campo olhando o pôr-do-sol sobre os arbustos floridos que cobriam o campo, imaginando se eu veria alguma coisa aparecer nos céus no limite entre o dia e a noite.

    Às vezes eu tinha medo de ver. Outras vezes, tinha medo de não ver.

    Divulgação
    Pôster do filme 'Os Invasores de Marte', de 1953
    Pôster do filme 'Os Invasores de Marte', de 1953

    Recentemente, voltei à melancolia dos tempos do campinho ao ver os filmes de ficção científica "Earth to Echo" e "The Signal", que à primeira vista possuem temas surpreendentemente similares: três garotos seguem um sinal misterioso no deserto do sudoeste norte-americano. Eles encontram uma aterrorizante presença alienígena com poderes misteriosos e são perseguidos por homens de aparência sinistra em caminhonetes.

    Ao final, boa parte daquilo em que eles acreditavam revela-se uma mentira.

    Mas a não ser por essa estrutura básica, os dois filmes possuem muito pouco em comum, incluindo a forma como você se sente ao sair do cinema.

    "Earth to Echo", que estreou nos Estados Unidos no dia 2 de julho, dirigido por Dave Green, é basicamente uma nova versão com iPhones e Google Glasses de "E.T. o Extraterrestre", a obra-prima feita em 1982 por Steven Spielberg. Interferências no telefones de Munch, Tuck e Alex fazem os três chegarem ao deserto de bicicleta. Essa é a última noite que passam juntos, porque o bairro onde vivem vai ser demolido para dar lugar a uma rodovia. Todo mundo terá de ir embora na manhã do dia seguinte.

    O sinal os leva a um robozinho danificado mas incrivelmente fofo, com o tamanho e o formato de uma coruja, e a colega de classe dos meninos, Emma, passa a noite toda percorrendo lojas de penhores e ferros-velhos em busca das peças de que ele precisa para voltar a funcionar, encontrar a nave mãe e voltar para casa (toda a ação é filmada pelos jovens em seus celulares, com a imagem tremida e tudo). Ao longo do caminho eles encontram diversos funcionários da equipe de construção da rodovia, que parecem interessados demais nas aventuras de nossos heróis.

    O filme culmina com um emocionante embate animado por computadores —se é que podemos dizer que animações são emocionantes— quando os meninos voltam para casa. Eu levei dois moleques de 12 anos para ver o filme e eles disseram que a cena é "da hora".

    Os jovens de "The Signal", dirigido por William Eubank, são um pouco mais velhos, alunos do MIT —porém não entendem muito mais de tecnologia do que os do outro filme. Nic e seu melhor amigo, Jonah, estão levando a namorada de Nic, Haley, para o Instituto de Tecnologia da Califórnia, quando decidem fazer um desvio para investigar um hacker chamado Nomad, que causou problemas para eles no MIT e parece estar monitorando o grupo.

    Eles seguem o sinal até uma casa abandonada no meio do deserto e é lá que toda a confusão acontece. Nic acorda em um hospital e laboratório subterrâneo operado por pessoas vestidas com trajes de proteção. Haley está em coma, e Jonah desapareceu.

    O pior é que, Laurence Fishburne, que faz o papel de um médico chamado Damon, está olhando para o rosto de Nic e afirma com um tom de voz tranquilo que lembra seu papel no filme "Matrix" que as novidades podem ser muito assustadoras. Porém, embora Nic fique cada vez mais frustrado e desesperado, o médico nunca diz muitas coisas, mas sempre entra no caminho todas as vezes que Nic —que chega a carregar Haley em uma maca— tenta escapar.

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    Cena do filme 'Earth to Echo
    Cena do filme 'Earth to Echo', dirigido por Dave Green

    Isso é especialmente difícil, já que Nic está em uma cadeira de rodas. Quando o encontramos, ele anda de muletas, depois de perder os movimentos das pernas em decorrência de uma doença desconhecida. O espectador aparentemente observa a Área 51, a base da Força Aérea que teria abrigado os segredos sobre os OVNIs nos EUA. Será que Nic foi contaminado por uma "entidade biológica extraterrestre"? Será que Damon é um alienígena? Qual é o verdadeiro lado de "fora"? A pílula azul, ou a vermelha?

    As opiniões dos críticos estão dividas em relação ao roteiro do filme, que impressionou o público no festival Sundance em janeiro, e não sabem se ele é bem amarrado, ou se não passa de uma sequência virtuosística de cenas desconexas. Se "Earth to Echo" faz parte da escola spielberguiana de ficção científica, cheio de fantasia e humanidade, "The Signal" pertence a uma linha mais parecida com "Amnésia" e "A Origem", na qual a noção de realidade é continuamente subvertida, de forma que a revelação final nem sempre responde todas as questões que se acumularam ao longo do filme.

    Nesse sentido, ele talvez seja mais parecido com a vida real.

    Mas de volta aos alienígenas. Enrico Fermi, o grande físico italiano, perguntou certa vez "Onde eles estão?": se existem extraterrestres em números tão grandes quanto os sugeridos por astrônomos como Carl Sagan, eles já teriam conseguido chegar até aqui.

    A questão de Fermi presume que eles ou seus artefatos não estejam por aqui. Mas como é que podemos saber?

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    Cena do filme 'The Signal
    Cena do filme 'The Signal', dirigido por William Eubank

    Os astrônomos sugeriram nos últimos anos que os robôs são a forma mais eficaz de explorar o universo. Marte e a lua foram observados do alto por artefatos alienígenas, mas se um objeto do tamanho de um iPhone caísse no Valles Marineris em Marte ou na cratera Tycho, na lua, ele não seria encontrado a menos que um astronauta passasse ao seu lado. Quanto ao planeta Terra, um avião inteiro simplesmente desapareceu sem deixar rastro este ano no Oceano Índico.

    Qualquer coisa pode estar por aí, incluindo um robô em forma de coruja no meio do deserto.

    Uma questão mais assombrosa e subversiva que você pode fazer após assistir "The Signal" é se nós mesmos estamos aqui. Por que achamos isso? Por que, conforme muitos físicos se perguntam hoje em dia, chegamos à conclusão de que estamos "aqui"?

    Eu finalmente assisti ao longa "Os Invasores de Marte" na sessão coruja, muitos anos mais tarde, quando era grande o bastante para rir de mutantes marcianos com roupas de borracha e zíperes à mostra. O filme teve até um final feliz, com a nave espacial sendo destruída e o garoto deitado em sua cama, percebendo que tudo não havia passado de um pesadelo.

    Mas então, ele observa o horizonte pela janela e, lá longe, um disco voador mergulha novamente na terra.

    E eu me vejo novamente no velho campo de beisebol, olhando para o céu pela janela. Às vezes torço para ver alguma coisa, outras vezes, tenho medo de ver.

    Tradução de CLARA ALLAIN

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