A odisseia de Christian Werner começou há dez anos. Professor do departamento de letras clássicas da Universidade de São Paulo, ele percebeu um mar de dúvidas entre os alunos da graduação quando tinham de enfrentar a leitura da "Odisseia", poema épico atribuído a Homero.
"Naquela época, as únicas traduções que haviam sido editadas no Brasil eram as de Odorico Mendes, do século 19, e de Carlos Alberto Nunes, dos anos 1960", diz Werner. "São leituras trabalhosas, sobretudo para alunos de 18 anos."
Foi assim que, em 2004, Werner começou a sua própria versão do poema sobre a volta para casa do herói Odisseu (ou Ulisses), que levou iguais dez anos para chegar a seu destino (a ilha grega Ítaca), após sobreviver à guerra de Troia.
A tradução chega neste mês às livrarias, em edição da Cosac Naify, ilustrada com colagens de Odires Mlászho.
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Colagem de Odires Mlászho em edição da 'Odisseia' da Cosac Naify |
O trabalho de Werner é o terceiro publicado no Brasil em três anos. Em 2011, a Editora 34 e a Companhia das Letras lançaram suas novas versões -até agora, a de Frederico Lourenço, para a Companhia, vendeu 8.000 exemplares.
Acredita-se que o poema data do século 8 a.C., mas quase tudo o que se diz a respeito desse épico grego é incerto.
Mesmo a autoria dos mais de 12 mil versos, inicialmente transmitidos pela tradição oral, é questionada: não se sabe se Homero existiu nem se foi o autor dos dois clássicos atribuídos a ele -primeiro a "Ilíada", sobre a guerra de Troia, e depois a "Odisseia". Segundo uma das hipóteses, o poeta foi neto de Odisseu.
O que se pode afirmar é que os poemas inauguram a literatura ocidental, e seus elementos míticos não só influenciaram a cultura através dos séculos, mas ainda conseguem dialogar com leitores atuais.
"É uma obra do aprendizado com desafios. Ler o poema é uma maneira de viajar com Odisseu pelas limitações humanas", diz Fernanda Lemos, professora de língua e literatura grega da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
'HOMELAND'
Para ela, Odisseu -também conhecido como Ulisses, graças às versões latinas do clássico- é um protótipo do humano, como aquele que consegue dominar as forças da natureza não pela agressividade, mas sobretudo pela astúcia.
"Ele traduz nossa multiplicidade. É um excelente guerreiro, mas chora de saudades."
Para Werner, dificilmente uma narrativa de viagem e de "volta para casa" não reverbera a travessia de Odisseu. Especialmente as que o protagonista deve provar a identidade quando chega ao lar.
"Ele chega a Ítaca, mas disfarçado, e não é reconhecido pela família", explica Werner.
Situação semelhante, compara, acontece no atualíssimo seriado "Homeland": "Depois de ser refém no Oriente Médio, o protagonista volta para casa, e a família não sabe como lidar com ele, nem ele com a família. Odisseu também".
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O diálogo com a cultura pop não facilita a leitura, mas Werner espera que ela consiga atrair um público amplo. Ele cita outros exemplos, como os filmes "Cold Mountain" e "Peixe Grande": "Este último é meu preferido, pois tematiza, como o clássico, o contar histórias, mentira e identidade".
Quanto à versão dele, a editora Maria Emilia Bender, da Cosac Naify, diz que o começo foi difícil, mas "encantador".
"Embora eu vá fazer 60 anos e seja editora, nunca tinha lido", diz. "Você precisa embarcar na história e atravessar o primeiro canto. Fiquei apaixonada."A travessia, pelo visto, não é só a do herói.
ODISSEIA
AUTOR Homero
TRADUÇÃO Christian Werner
EDITORA Cosac Naify
QUANTO R$ 79 (640 págs.) e R$ 159 (com colagens encartadas)
Editoria de Arte/Folhapress | ||