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    Restauro desastroso de 'Ecce Homo' promove turismo na Espanha

    DOREEN CARVAJAL
    DO "NEW YORK TIMES", EM BORJA (ESPANHA)

    20/12/2014 03h09

    Quando uma viúva espanhola de 83 anos, pintora amadora, tentou restaurar um afresco quase centenário que retratava Jesus na igreja da sua cidade, ela acabou sendo completamente ridicularizada.

    A notícia da desastrada —ainda que bem-intencionada— restauração ganhou o mundo em 2012 via redes sociais. Porém, agora, os moradores desta pequena localidade espanhola estão fazendo uma miraculosa reavaliação da artista Cecilia Giménez e de sua obra.

    A tristeza se transformou em gratidão pela abençoada publicidade gratuita que fez de Borja, cidadezinha de apenas 5.000 habitantes. O acontecimento foi um ímã para milhares de turistas ávidos para conhecerem o trabalho da idosa, o que contribuiu para a ressurreição da economia local.

    As vinícolas da região disputam o direito de usar a imagem em seus rótulos. A borrada representação visual de Cristo passou a ser vista como um ícone da pop art.

    Giménez é homenageada todos os anos pelos moradores em 25 de agosto. Uma ópera cômica sobre o episódio está sendo preparada nos Estados Unidos. "Para mim, é uma história de fé", disse Andrew Flack, libretista da ópera, que viajou a Borja para fazer a pesquisa.

    Desde que foi restaurada, a imagem já atraiu mais de 150 mil turistas de todo o mundo para o santuário de Nossa Senhora das Mercês, templo gótico do século 16. Os visitantes pagam um euro para observar o afresco, que está em uma parede descascada por trás de uma proteção transparente.

    O "Ecce Homo" ("eis o homem") original da igreja era o retrato de um Jesus triste, datada da década de 1930, quando Elías García Martínez, professor de arte de Zaragoza, fez a pintura na parede da igreja.

    Os moradores de Borja não costumavam dar muita bola para a obra. Mas, com o passar dos anos, Giménez começou a se incomodar ao notar que o terço inferior do afresco estava se apagando, sucumbindo à umidade da igreja.

    Ao longo dos anos, com o aval do padre da paróquia e dos responsáveis pela conservação da igreja, ela repetidamente retocou o afresco. Até que foi necessária uma restauração mais profunda, a qual foi subitamente interrompida devido a queixas recebidas após a primeira etapa feita por Giménez.

    O caso saiu num jornal local e aí se espalhou pelo mundo. "Fiquei arrasada", disse ela. "Diziam que uma velha louca havia destruído uma obra que valia muito dinheiro."

    Hoje ela virou celebridade. Entrega prêmios numa competição para jovens artistas que fazem suas próprias versões do "Ecce Homo". A imagem criada por ela está estampada nos bilhetes da loteria municipal e foi incluída em um filme espanhol em que dois ladrões tentam roubar a obra.

    "Não consigo explicar a reação", disse o prefeito de Borja, Miguel Arilla."Fui ver eu mesmo o 'Ecce Homo', e ainda não entendo."

    Por causa da crise econômica dos últimos seis anos, 300 postos de trabalho foram extintos na cidade, segundo o prefeito, mas o crescimento da atividade turística permite que os restaurantes se mantenham estáveis.

    O Museu da Colegiada, que tem um acervo de arte sacra e medieval e fica próximo do santuário das Mercês, viu seu número de visitantes saltar de 7.000 por ano para 70 mil.

    José M. Baya, dono do restaurante La Bóveda, que fica na praça do mercado, credita a prosperidade do seu estabelecimento à arte da idosa. Seu local, instalado em uma antiga adega de pedra, atrai turistas gastadores, inclusive, segundo ele, uma equipe de cinema do Japão que pediu todos os itens do cardápio de duas páginas.

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