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    Crítica: Com brilho, Cronenberg retrata o presente em novo filme

    INÁCIO ARAUJO
    CRÍTICO DA FOLHA

    19/03/2015 02h19

    Ver em "Mapas para as Estrelas" um filme contra Hollywood equivale a não ver "Mapas para as Estrelas". A cidade do cinema, nesta nova obra de David Cronenberg, é apenas o lugar onde um determinado modo de ser do mundo –contemporâneo– se instalou com mais intensidade, já que ali concentram-se celebridades, seus próximos, assessores e todos os demais que os cercam.

    Trata-se de lugar a um tempo frenético, pueril, violento, incerto. Breve, de um resumo do mundo. É ali aonde chega Agatha (Mia Wasikowska), aparentemente deslumbrada com a perspectiva de passar diante das casas das estrelas do cinema.

    Na verdade, ela é a filha indesejada de Havana (Julianne Moore) e do dr. Stafford Weiss (John Cusack). Ela, uma atriz –insegura como são com frequência as atrizes. Ele, um misto de terapeuta, guru de artistas e estrela de programa de televisão (portanto, uma espécie de celebridade das celebridades).

    Divulgação
    Julianne Moore em cena de "Mapa para As Estrelas"
    Julianne Moore em cena de "Mapa para As Estrelas"

    Eles têm outro filho, um menino-prodígio, Benjie (Evan Bird). O jovem ator que interpreta o papel talvez seja, no elenco, o mais cronenberguiano dos atores, com seu rosto discretamente anômalo. Outros personagens, no entanto, portarão de um modo ou outro alguma anomalia corporal, como Agatha, que nunca tira as luvas.

    A palavra disfuncional talvez se aplique à família. Mas sua carga médica nos desvia do ponto cronenberguiano. Sua anomalia, que se mostrará aos poucos, expressa algo que vai além: tornar-se famoso, "célebre", deixou de significar reconhecimento por um feito ou trabalho para ser a substância mesmo de seus atos.

    Essa é a sua maneira de ser mutante (já não monstros físicos, como nos filmes do século 20 do diretor canadense, mas monstros morais ou psíquicos).

    Assim era, também, o magnata de "Cosmópolis" (2012), cuja vida tinha por limite sua limusine, de onde controlava ou tinha a ilusão de controlar o mundo. Era a versão econômica, digamos, do fenômeno de que aqui Cronenberg observa a vertente cultural.

    Do que serve a vida das personagens de "Mapas"? Que valores são esses que estamos construindo, que talvez não passem de deformação de valores anteriores? Se o magnata de "Cosmópolis" renunciava à vida para controlar seu ouro dia e noite, as celebridades de "Mapas" vivem apenas para preservar essa condição.

    Ou seja, não vivem. Eis um diagnóstico terrível. O canadense, que em outros tempos nos mostrava os terrores de um futuro incerto, agora nos atira ao labirinto de um presente não menos inquietante. Com brilho, sempre.

    MAPAS PARA AS ESTRELAS
    (Maps to the Stars)
    DIREÇÃO David Cronenberg
    ELENCO Julianne Moore, John Cusack, Mia Wasikowska e Robert Pattinson
    PRODUÇÃO EUA/ Canadá/ Alemanha/ França, 2014, 16 anos
    QUANDO estreia nesta quinta (19)
    AVALIAÇÃO ótimo

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