O diretor e dramaturgo chileno Guillermo Calderón, 44, notabilizou-se, na Europa e nos Estados Unidos, como uma das figuras mais proeminentes do teatro latino-americano, com suas encenações secas e seu discurso político.
Já trouxe a festivais brasileiros criações suas –no ano passado, encenou "Escola" na MIT - Mostra Internacional de Teatro de São Paulo.
Só agora, no entanto, seu trabalho ganha adaptação brasileira, com "Dezembro", montagem do núcleo Isso Não É Um Grupo que acaba de estrear na capital paulista.
"A gente está começando um processo de olhar mais para a América Latina", opina Diego Moschkovich, que dirige o espetáculo.
TRILOGIA
"Dezembro" (2009) é a última parte de uma trilogia que se propõe a dissecar a história e a política do Chile.
A primeira, "Neva" (2006), volta à Rússia de 1905, pré-revolução, com seus problemas políticos e sociais, para fazer um paralelo com o regime militar chileno (1973-1990).
"Classe" (2008), a segunda, retrata no presente os traumas deixados pela ditadura no país (em especial na geração de Calderón).
Já "Dezembro" viaja a um futuro pouco distante, quando Peru e Bolívia estariam em guerra. Na noite de Natal, as gêmeas Paula e Trinidad (Carolina Fabri e Michelle Gonçalves) recebem Jorge (Ernani Sanchez), seu irmão mais novo, recém-chegado do front.
Em um ambiente que remete a um bunker, tentam celebrar a data, mas seus conflitos pessoais se mesclam aos problemas sociais e políticos que os rodeiam.
"Calderón esconde, no meio das questões pessoais, a camada de ação [a guerra]", diz Moschkovich. Na montagem, manteve-se ainda outro traço do chileno: uma encenação seca, sem grandes elementos cenográficos.
PERIGO IMINENTE
"Em 'Dezembro', me interessou retratar uma guerra futura porque me pareceu que essa seria a conclusão natural do nacionalismo fascista ainda presente no Chile", afirma o dramaturgo à Folha. "E é um futuro próximo, um perigo iminente."
O conflito também faz alusão à recente imigração peruana no Chile. "É um fenômeno muito visível que os chilenos assumem em contradição", explica. "Por um lado, a população gosta que pessoas de outros países se interessem em morar no Chile. Por outro, teme-se que a imigração reduza as oportunidades de trabalho."
Segundo Moschkovich, não foi preciso adaptar o texto à realidade brasileira, dada a proximidade social e política entre os países. "Temos traumas parecidos [das ditaduras], que ainda estamos trabalhando para superar."
A temática é recorrente na obra de Calderón. "O teatro chileno sempre foi político. As instituições no país não foram capazes de cuidar do profundo trauma da ditadura, e o teatro preencheu esse vazio", afirma o dramaturgo.
DEZEMBRO
QUANDO seg. a qua., às 20h30; até 2/9 (não haverá sessão em 18/8)
ONDE Sesc Consolação, r. Dr. Vila Nova, 245, tel. (11) 3234 3000
QUANTO R$ 6 a R$ 20
CLASSIFICAÇÃO 12 anos