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    Selva Almada retrata famílias quebradas em 'O Vento que Arrasa'

    SYLVIA COLOMBO
    DE SÃO PAULO

    22/08/2015 02h50

    Quatro integrantes de famílias destroçadas se encontram numa oficina mecânica, no meio do campo, no Chaco, no norte da Argentina.

    Um pastor evangélico e sua filha adolescente param em busca de reparo para o carro em que viajam. No local, encontram o mecânico e um rapaz, que trata como filho.

    Num espaço de tempo que corresponde a um dia e meio, vão interagir num cenário de desolação e poucas certezas, além de confrontar seus medos e crenças.

    Lembranças e "flashbacks" dão as chaves para entender que cada um tem um passado que contradiz um pouco quem são no presente.

    Adriano Vizoni/Folhapress
    SAO PAULO - SP - BRASIL, 19-08-2015, 16h20: SELVA ALMADA. Retrato da jovem escritora argentina Selva Almada, lancada aqui pela editora Cosac Naify. (Foto: Adriano Vizoni/Folhapress, ILUSTRADA) ***EXCLUSIVO FSP***
    A escritora argentina Selva Almada, autora de 'O Vento que Arrasa'

    Essa é a trama de "O Vento que Arrasa", romance da argentina Selva Almada, 42, lançado pela Cosac Naify.

    "Quis construir uma história sem mães. E com famílias quebradas, mais parecidas às que de fato existem nessa região. Há mulheres que têm de partir para buscar trabalho e sustentar os filhos, outras que são abandonadas e cujos filhos jamais sabem delas", diz Almada, em entrevista num hotel de São Paulo.

    A autora nasceu em Entre Ríos, uma província próxima à de Buenos Aires, e de início publicou contos que não tiveram muita projeção nacional.

    Até que, em 2012, a renomada crítica argentina Beatriz Sarlo topou com "O Vento que Arrasa" e escreveu, numa resenha publicada no jornal "Perfil": "De onde vem esse romance surpreendente?". Bastou para que o livro de Almada passasse a ser lido, resenhado e comentado no mercado editorial portenho.

    "Creio que há um novo momento na literatura argentina, em que a produção dedicada a retratar o interior do país volta a ganhar espaço", diz.

    O país vizinho teve uma rica produção, principalmente nos séculos 19 e início do 20, que tratava dos temas do campo, como nas obras de Ezequiel Martínez Estrada (1895-1964) ou Domingo Faustino Sarmiento (1811-88).

    FEMINICÍDIO

    "Isso foi até os anos 1960/70. Depois, começou a prevalecer um tipo de romance mais urbano, produzido em Buenos Aires, que se relacionava um pouco com o que acontecia também em outras cidades latino-americanas", diz. "Agora vejo que há uma retomada desses assuntos das províncias e um inevitável diálogo com esses autores mais tradicionais."

    Ela escreveu também o romance "Ladrilleros" (ed. Mar Dulce, importado) e um livro de não ficção, "Chicas Muertas" (ed. Sudamericana, importado), em que investiga casos de mulheres assassinadas na região em que cresceu. Ambos sem tradução no Brasil.

    "Foram crimes muito marcantes para mim, porque eu era uma adolescente, e os adultos nos diziam que o perigo estava no exterior, nas pessoas que estavam fora de nossa casa. E a morte dessas mulheres contradizia isso, elas haviam sido mortas por familiares. Isso me marcou muito, e levei na cabeça por anos. Até que resolvi estudar os casos, que foram pouco noticiados e estavam perdidos no passado", explica.

    O livro saiu na Argentina num momento oportuno, quando começaram as manifestações de rua contra os crimes contra mulheres. A maior delas reuniu 300 mil pessoas, em Buenos Aires.

    "Me dói ver que agora todos os candidatos presidenciais [a votação ocorre em 25 de outubro] estão falando de feminicídio e tentando trazer a bandeira para o lado deles, mas pelo menos virou um assunto da agenda política", diz. "Isso é bom."

    O VENTO QUE ARRASA
    AUTOR: SELVA ALMADA
    TRADUÇÃO: SAMUEL TITAN JR.
    EDITORA: COSAC NAIFY
    QUANTO: R$ 29,90 (122 PÁGS.)

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