Desde que fez "Amores", em 1998, Domingos Oliveira tem realizado filmes pessoais e baratos, com equipes formadas por amigos e colaboradores. "Infância", seu mais recente longa, conta com mais verba e uma produção mais caprichada. Infelizmente, o texto não é dos mais inspirados de Oliveira.
Adaptado da peça "Do Fundo do Lago Escuro", de autoria do próprio cineasta, o filme se passa nos anos 1950, em um único dia e em uma só locação, um casarão no Rio, onde a matriarca de uma rica família, a viúva Dona Mocinha (Fernanda Montenegro), promove um encontro com familiares e um amigo.
O alter ego de Oliveira é o menino Rodriguinho (Raul Guaraná), neto de Dona Mocinha. Ele mora com a mãe, Conceição (Priscilla Rozenbaum) e o pai, Henrique (Paulo Betti). Ao longo do dia, a família recebe a visita do tio Orlando (Ricardo Kosovski).
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Fernanda Montenegro em cena de "Infância" |
A estrutura da história é manjada: reunião familiar acaba em lavagem de roupa suja e com revelação de segredos.
Acontece que nem personagens nem histórias são interessantes o suficiente para cativar e criar tensão.
Os personagens são arquétipos de comédias de costumes: Dona Mocinha é uma coroa reacionária que ama Carlos Lacerda e odeia Samuel Wainer; Henrique é procurador de Dona Mocinha, mas faz negócios escusos sem consultá-la; Conceição é a mulher subserviente, e Orlando é um beberrão recém-divorciado que vive se engraçando para cima da empregada gostosona (Nanda Costa).
Os conflitos internos não têm clímax, mas murcham de repente, com resoluções decepcionantes. Uma discussão familiar termina –clichê dos clichês– com um personagem desmaiando de nervoso.
Outro problema é a narração, feita pelo próprio cineasta. Oliveira não tem, entre seus inúmeros talentos, uma dicção das mais compreensíveis.
O resultado é um muxoxo praticamente ininteligível, que soa como Paulo Francis fazendo gargarejo. Era questão de se pensar em colocar legendas.
ANDRÉ BARCINSKI é jornalista e autor do livro "Pavões Misteriosos" (Três Estrelas)