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    Cabo eleitoral de luxo nos EUA, filme de Michael Bay dá força a republicanos

    RODRIGO SALEM
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE LOS ANGELES

    15/01/2016 17h19

    Filmes programados para servir como cabos eleitorais de luxo não são uma novidade em Hollywood. Em 2004, Michael Moore tentou prejudicar a reeleição de George W. Bush ao demonstrar os erros da política externa do presidente no documentário "Fahrenheit 11 de Setembro". Na eleição seguinte, na qual Barack Obama disputou com John McCain, foi a vez de Oliver Stone caricaturar a família Bush em "W.".

    Então, não chega a ser uma surpresa que Michael Bay ("Transformers") esteja lançando "13 Horas: Os Soldados Secretos de Benghazi" a poucas semanas do início das eleições primárias americanas –que servem para os partidos escolherem seus candidatos à disputa pela presidência, em novembro. Mas é surpresa na Hollywood liberal, no entanto, um longa-metragem que aborde um episódio que dê forças aos conservadores republicanos.

    O filme é a dramatização –se é que podemos chamar assim alguma obra do nada sutil Michael Bay– de um ataque de 2012 a um posto diplomático dos Estados Unidos em Benghazi, na Líbia, que resultou na morte do embaixador J. Christopher Stevens e mais três norte-americanos. O episódio é um Calcanhar de Aquiles da candidatura democrata de Hillary Clinton, na época Secretária de Estado de Obama.

    Os republicanos –que hoje têm o milionário Donald Trump como favorito à candidatura– batem na tecla de que a falta de pulso de Clinton e a demora em assumir alguma ação custou a vida dos seus compatriotas. Trump falou no programa radiofônico "The Howie Carr Show" que "ainda não viu o filme", mas "gostaria de ver, se tiver tempo."

    Mas ele pode se decepcionar. "13 Horas: Os Soldados Secretos de Benghazi" é tão politizado quanto "Transformers" é um drama shakespeariano sobre a amargura da alma humana. O roteiro de Chuck Hogan ("Atração Perigosa") nunca menciona Hillary Clinton e, mesmo citando a falta de liderança militar na ação por parte do governo, não há uma acusação formal.

    Michael Bay está preocupado em construir mais um dos seus filmes repletos de patriotadas, tornando soldados em pessoas comuns que conseguem vencer um inimigo selvagem mais poderoso –alguém aí lembra de "Pearl Harbor"? Assim, ele se concentra na história de Jack Silva (John Krasinski), um ex-Navy Seal que vira agente de proteção particular e se junta a outros ex-soldados para proteger agentes da CIA em uma estação secreta em Benghazi. Eles, por sua vez, tornam-se a única resistência quando centenas de rebeldes líbios atacam o local.

    Nas mãos de um diretor mais sereno, o episódio poderia ramificar em interessantes gêneros de ação. Há potencial para thriller político com a alta cúpula do Pentágono ou um belo exemplar de espionagem moderna, já que o chefe da estação da CIA não aceita ordens de um grupo criado após os ataques de 11 de setembro para protegê-lo. Conduzido por Bay, "13 Horas", principalmente na segunda metade do longa, vira um caos de explosões e tiros que anula qualquer possibilidade de intriga ou emoção –ele até repete a famigerada "câmera-bomba" usada em "Pearl Harbor".

    De certa forma, isso faz sentido com as declarações de Bay atestando que seu longa não é político –de acordo com o "The New York Times" até a mãe do diretor pediu para ele se afastar do tema. Por outro lado, na última terça-feira (12), o filme teve uma pré-estreia nababesca para 80 mil pessoas no estádio AT&T, lar do time de futebol americano Dallas Cowboys, no Texas, Estado majoritariamente republicano. Ou seja: involuntariamente já virou bandeira armamentista, uma das pilastras republicanas no sul dos EUA.

    "13 Horas: Os Soldados Secretos de Benghazi", baseado no livro de Mitchell Zuckoff, faz parte da pornografia militar que anda tomando conta de parte do setor cultural norte-americano. Por exemplo, "Serial", um dos podcasts (programas de áudio na internet) de maior sucesso da atualidade largou os assassinatos para dedicar sua nova temporada à história de um soldado americano que passou cinco anos nas mãos do Talibã.

    Já o canal Nat Geo vai exibir uma série comandada pelo documentarista Sebastian Junger ("Restrepo") sobre as guerras na Síria e no Iraque –além da série "No Man Left Behind", sobre resgates reais de soldados.

    Isso sem contar que janeiro, nos cinemas americanos, significa um domínio de temas militares. "O Grande Herói", de Peter Berg, rendeu US$ 125 milhões em janeiro de 2014 somente nos Estados Unidos, enquanto "Sniper Americano", de Clint Eastwood, alcançou inacreditáveis US$ 350 milhões. Ainda é cedo para saber quanto "13 Horas: Os Soldados Secretos de Benghazi" pode lucrar, já que o longa estreou na noite desta quinta-feira (14) nos EUA. Mas os efeitos reais só saberemos mesmo em novembro, quando os primeiros votos forem contados.

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