• Ilustríssima

    Friday, 19-Apr-2024 16:08:27 -03

    70 anos depois do fim, Segunda Guerra ainda inspira o cinema

    RICARDO BONALUME NETO
    ilustração CAMILA SOATO

    25/10/2015 02h01

    RESUMO Passados 70 anos do fim da Segunda Guerra Mundial, o conflito continua sendo nicho de produtos culturais tanto na área histórica quanto na ficção. Este texto percorre representações do maior conflito da humanidade no cinema. Muitas buscam ser realistas, em que pese a tendência de romantização dos fatos.

    Foto Eduardo Anizelli/Folhapress

    A maioria dos soldados da maioria das guerras do século 20 nunca tinha participado de um combate antes. Para eles, a experiência mais parecida com a situação real eram os filmes de guerra. Soldados britânicos avançando à noite contra os argentinos nas ilhas Malvinas, em 1982, relatam em seus livros de memórias que o efeito das balas traçadoras (iluminadoras) lembrava cenas de filmes sobre a Segunda Guerra Mundial.

    O maior e mais devastador conflito da história humana, encerrado há 70 anos, foi e continua sendo tema de inúmeros filmes, muitos deles entrelaçados com outras narrativas -romances, memórias e livros de história. Hollywood e uma parte dessa literatura tendem ainda hoje a romantizar a Segunda Guerra.

    Em parte isso é explicável pela falta de consenso nacional nos Estados Unidos a respeito de conflitos posteriores, como as intervenções na Coreia, no Vietnã, no Líbano, na Somália, no Afeganistão ou no Iraque. Sendo assim, a Segunda Guerra passou a ser a "boa guerra", título usado ironicamente por Studs Terkel em uma coletânea de história oral sobre o confronto -"The Good War" (The New Press), livro que foi contemplado com o Pulitzer em 1985.

    O cinema tentou, com variável grau de sucesso, reproduzir o som e a fúria da guerra. O realismo, obviamente, ganhou força com a explosão técnica dos efeitos especiais e da computação. Os resultados mais sofisticados chegam a ser chocantes, como vemos no início de "O Resgate do Soldado Ryan" ("Saving Private Ryan", 1998), dirigido por Steven Spielberg e estrelado por Tom Hanks. As cenas mostram o desembarque americano na praia Omaha, na Normandia, em 1944. Alguns veteranos da guerra sentiram-se mal e tiveram de ser retirados de salas de cinema ainda no começo do filme.

    Spielberg e Hanks selaram uma produtiva parceria para retratar o conflito. Em 2001 eles produziram para o canal HBO a minissérie "Band of Brothers", baseada no livro de mesmo nome, lançado em 1992, pelo historiador Stephen Ambrose e publicado em português pela Bertrand Brasil, com o subtítulo "Companhia de Heróis". A série acompanha as missões de uma companhia de paraquedistas americanos desde o Dia D até o final da guerra na Europa.

    "Band of Brothers" refletia bem uma linha de interpretação sobre o motivo que levaria pessoas a combaterem: não é pela pátria, tampouco por uma ideologia; é pelos colegas de trincheira. O grupo transforma-se numa espécie de família, um "bando de irmãos", como escreveu Shakespeare na peça "Henrique 5º".

    A dupla também produziu outra minissérie importante em 2010, "The Pacific", dessa vez centrada na vida de três fuzileiros navais norte-americanos na guerra contra o Japão -Eugene Sledge, John Basilone e Robert Leckie.

    A série é extremamente fiel aos livros de memórias de Sledge e Leckie e às biografias de Basilone.

    O livro de Sledge ("With the Old Breed: at Peleliu and Okinawa", com a velha casta: em Peleliu e Okinawa, de 1981) é particularmente horripilante. Nem o cinema consegue reproduzir suas descrições de cadáveres apodrecendo na lama, cobertos de vermes, ou a sensação de pisar neles e sentir a emissão de seus gases e cheiros nauseabundos. Seria preciso que filmes tivessem odor e tato para serem fiéis à descrição; além, claro, de passarem o medo constante da morte ou de ferimentos.

    ESFORÇO

    Bem antes de terminar -em maio de 1945 na Europa, em setembro na Ásia-, a Segunda Guerra já era objeto da literatura e do cinema. Muito dessa produção, realizada tanto pelos Aliados como pelos países do Eixo, fazia parte do esforço de guerra, a tentativa de levantar o moral das tropas e das populações -aquilo que, num conflito posterior, se chamaria "ganhar corações e mentes".

    Em meio ao joio, contudo, havia trigo de qualidade. Não eram apenas documentários e cinejornais efêmeros ou obras encomendadas. Excelentes livros de memórias começaram a ser escritos e diretores jovens e brilhantes iniciaram na guerra suas carreiras cinematográficas.

    Foto Eduardo Anizelli/Folhapress

    Com a paz e o final da censura -tanto a real como a autoimposta-, surgiu uma torrente de novos livros e filmes. Os historiadores, artífices de produção mais lenta e ponderada, tiveram de esperar a abertura de arquivos, a publicação memorialística dos protagonistas e seu interesse em dar ou não entrevistas e depoimentos.

    Clio, a musa da história, tem, contudo, um valioso aliado: o tempo. Sem ela, as outras musas não teriam material para produzir suas próprias obras. Em que pesem os momentos propagandísticos, a história está presente nesses mais de 70 anos de literatura e cinema. Qualquer filme novo tem hoje uma sólida base historiográfica -como demonstram as próprias parcerias de Spielberg e Hanks.

    Isso também tornou-se realidade no caso brasileiro. O país lutou contra o Eixo no Atlântico Sul e enviou a Força Expedicionária Brasileira (FEB) para a Itália em 1944.

    Desde então, foram feitos alguns bons documentários sobre a participação do Brasil na guerra (e um péssimo, de 1990, "Rádio Auriverde", de Sylvio Back), além de minisséries toscas de televisão. Um dos melhores livros é "Senta a Pua!" (1980), do aviador Rui Moreira Lima, piloto do 1º Grupo de Caça na Itália -que em 1999 virou ótimo documentário com o mesmo nome, dirigido por Erik de Castro.

    Foi só após o surgimento de uma historiografia sólida e crítica, com ênfase no cotidiano dos soldados, marinheiros e aviadores, que se tornou possível fazer no país um excelente filme de ficção, "A Estrada 47" (2013), de Vicente Ferraz, que estreou neste ano.

    Já não existe hoje nenhum grande mistério histórico envolvendo o conflito que matou em torno de 60 milhões de pessoas -a não ser, claro, para os malucos de teorias conspiratórias que acreditam que Adolf Hitler criou seu Quarto Reich na Antártida, com escala na Patagônia argentina.

    O último -único, na verdade-grande segredo sobre a condução da guerra ficou guardado até a década de 1970. Durante vários anos os Aliados tentaram interceptar as comunicações militares alemãs; o esforço foi feito por poloneses, franceses e britânicos, mas só estes últimos obtiveram sucesso, pois França e Polônia logo foram ocupadas pelos nazistas.

    ULTRASSECRETO

    O projeto Ultra conseguiu manter-se secreto de forma quase inacreditável, já que envolvia centenas de pessoas. Quando os historiadores se deram conta das informações vitais que ele passava aos líderes aliados na Europa, foi preciso reescrever trechos de um bom número de livros.

    Não foi o caso, porém, da mais famosa série de memórias sobre a época, escrita pelo então primeiro-ministro britânico Winston Churchill. Ele era o principal usuário do Ultra, número um na lista (até virou um viciado nessas mensagens secretas), mas conseguiu escondê-lo por completo na sua brilhante -e extremamente parcial- obra memorialística do pós-Guerra.

    Um filme que concorreu em oito indicações ao Oscar neste ano mostra que o tema continua atual: "O Jogo da Imitação" ("The Imitation Game"), com Benedict Cumberbatch no papel do gênio matemático e criptógrafo Alan Turing, que deu vida ao projeto Ultra.

    Os britânicos, vivendo em ilhas relativamente invulneráveis a uma invasão nazista graças à sua Marinha, então a maior do mundo, conseguiram manter o moral alto ao resistirem aos bombardeios aéreos germânicos e, por isso, tiveram tempo de fazer livros, música e cinema para elevar ainda mais o ânimo nacional -diferentemente de franceses, belgas, holandeses, poloneses, noruegueses, dinamarqueses, gregos ou iugoslavos.

    Para o grande império marítimo e colonial britânico, a força naval era fundamental também como um símbolo de identidade da nação. (O verdadeiro centro emocional de Londres é a praça Trafalgar, batizada em homenagem à batalha vencida em 1805 pelo almirante Horatio Nelson contra as naus de França e Espanha.)

    Não por acaso "Nosso Barco, Nossa Alma" ("In Which We Serve", 1942), foi e continua sendo o clássico filme de guerra britânico realizado durante o conflito. Dirigido por Noël Coward e David Lean, teve total apoio do governo e dos militares.

    O enredo é baseado na história real do destróier HMS Kelly, comandado pelo lorde Louis Mountbatten, e seu afundamento durante a batalha de Creta, em 1941. Críticos afirmam que Coward e Lean foram esteticamente influenciados por outro clássico da época, embora não voltado para a Segunda Guerra -"Cidadão Kane" ("Citizen Kane", 1941), de Orson Welles, O destróier do filme, batizado de HMS Torrin, simboliza a nação; é atacado e afundado, mas isso não implica o fim da resistência aos nazistas.

    Destróieres eram os navios de guerra mais versáteis, equipados para lutar contra aviões, submarinos e embarcações de superfície. Um deles, o britânico HMS Bulldog, conseguiu capturar uma presa importantíssima do submarino alemão U-110: uma máquina Enigma em boas condições, fundamental para Turing e seus colegas desenvolverem o projeto Ultra. Mas um filme americano, "U-571" (2000) roubou o crédito para um submarino ianque! Não pegou nada bem do outro lado do Atlântico.

    Não é demais lembrar que mesmo antes de os Estados Unidos entrarem no conflito, após o ataque japonês à base de Pearl Harbor, no Havaí, em 7 de dezembro de 1941, Hollywood já estava engajada com os Aliados -tanto que uma bela safra de filmes já apareceria em 1942, levando-se em conta que são necessários meses, mesmo anos, para uma boa produção.

    COMBATE

    Para a maior parte dos críticos e cinéfilos, um filme de guerra tem que envolver combate. Essa visão ortodoxa, no entanto, deixa de lado muita coisa boa que tem a guerra como pano de fundo. Existem subgêneros que podem ser muito bons, sem que um tiro precise ser disparado.

    É o caso de filmes sobre prisioneiros de guerra, como o seminal "Stalag 17" ("Inferno Nº 17", de 1953), dirigido por Billy Wilder. Estrelado por William Holden, o longa conta a história de aviadores americanos, presos no campo de prisioneiros alemão número 17, que suspeitam que um deles seja um informante dos nazistas.

    Um curioso derivado do filme foi uma das mais populares séries de TV americanas da década de 1960, a comédia "Hogan's Heroes" (no Brasil, "Guerra, Sombra e Água Fresca"). No episódio piloto (em preto e branco, assim como "Stalag 17"), o pessoal do coronel Robert Hogan tem que descobrir quem é o informante nazista no Campo 13. O restante da série, que passou nos EUA entre 1965 e 1971, foi filmada em cores.

    Um exemplo recente de filme no qual o combate é pouco importante é "Caçadores de Obras-Primas" ("The Monuments Men", 2014), dirigido por George Clooney, sobre a busca, pelos Aliados, dos tesouros artísticos europeus saqueados pelos nazistas. Estima-se que cerca de 650.000 obras de arte tenham sido levadas de museus e de coleções particulares.

    Outro bom exemplo de filme de guerra que não tem combate é um "cult" dos maiores de todos os tempos: "Casablanca", de 1942, protagonizado por Humphrey Bogart e Ingrid Bergman. Bogart é um americano dono de uma casa noturna nessa cidade do Marrocos, então sob controle do governo francês de Vichy, colaboracionista com os alemães. Os EUA ainda não tinham entrado na guerra, e ele tem que optar entre o amor de uma mulher ou ajudá-la a fugir dali com seu marido, líder da Resistência tcheca.

    Bogart em seguida estrelou outro longa da safra produzida ainda durante a guerra: "Sahara", de 1943 (que no Brasil teve o subtítulo "Em Busca da Sobrevivência"). Ele é um sargento no comando de um tanque médio M-3 vinculado ao 8º Exército Britânico no Norte da África. Depois de uma derrota, obra do brilhante general alemão Erwin Rommel, o tanque chamado "Lulubelle" vaga pelo deserto do Saara procurando água e coletando gente pelo caminho. Não é um filme repleto de ação; mas tem suspense, bons diálogos, e uma excepcional interpretação de Bogart. Mais um na categoria "clássico".

    PELOTÃO

    Tanques -ou "carros de combate", no jargão do Exército Brasileiro- e seus tripulantes não costumam ser os grandes astros em filmes de guerra. O clichê narrativo tradicional, que vale para inúmeros conflitos, é concentrar a ação em torno de uma pequena unidade de infantaria, um pelotão ou grupo de combate, com seus distintos personagens e grupos étnicos -no caso americano, o garoto malandro de Nova York ou Chicago, o caipira do sul, o boa-vida da Califórnia, o judeu, o ítalo-americano, o negro do gueto etc.

    Mas o ator Telly Savalas comanda um tanque em "Os Guerreiros Pilantas" ("Kelly's Heroes"), comédia de 1970 que também inclui astros como Clint Eastwood e Donald Sutherland. O filme conta a história de um grupo de soldados americanos que penetra as linhas alemãs para roubar um banco.

    Um exemplo recente, lançado nos EUA em 2014, traz Brad Pitt como comandante do tanque "Fury" (mesmo nome do filme; lançado neste ano no Brasil como "Corações de Ferro"). Mais uma vez, o acúmulo de historiografia e memória permitiu a produção de um longa razoavelmente realista.

    A simbiose entre cinema e literatura teve dois perfeitos exemplos nos dois grandes filmes baseados na obra do jornalista irlandês Cornelius Ryan (1920-74), autor de livros de história chamados de "populares" por acadêmicos, pois são baseados principalmente em entrevistas com veteranos, e não em documentos. Pura inveja, pois Ryan foi à fonte antes de ela secar -os raríssimos veteranos da guerra hoje em toda a parte do mundo já ultrapassaram os 90 anos.

    "O Dia Mais Longo" ("The Longest Day: 6 June 1944 D-Day") foi publicado em 1959 e trata da invasão aliada da Normandia. Ryan entrevistou mais de mil pessoas. Foi transposto para o cinema em 1962.

    "Uma Ponte Longe Demais" ("A Bridge Too Far"), de 1974, virou filme em 1977. O tema é o fracassado ataque aliado de paraquedistas na Holanda, em 1944.

    Ryan foi atrás de dois temas fundamentais para a visão anglo-americana da guerra. E os filmes baseados em seus livros tiveram elencos recheados de celebridades do cinema. "O Dia" reuniu John Wayne, Richard Burton, Sean Connery, Henry Fonda, Richard Todd, Robert Mitchum, Peter Lawford, Rod Steiger, Curt Jürgens, Robert Wagner e Paul Anka, entre outros.

    "Uma Ponte" teve Gene Hackman, Laurence Olivier, Robert Redford, Dirk Bogarde, Ryan O'Neal, James Caan, Michael Caine, Sean Connery, Edward Fox, Elliott Gould, Anthony Hopkins, Maximilian Schell e Liv Ullmann.

    FRENTE RUSSA

    Por mais estrelas que os anglo-americanos tenham desfilado em seus filmes, é inegável que a frente de combate mais importante da guerra real foi a russa. A União Soviética teve que lutar -e vencer- contra cerca de dois terços do Exército alemão, dependendo do momento. A guerra ali foi a mais brutal da Europa.

    Esse cenário sangrento está na historiografia e, para o fã de cinema, em alguns poucos mas expressivos filmes, como "A Cruz de Ferro" ("Cross of Iron", 1977), coprodução anglo-alemã, dirigida por Sam Peckinpah, protagonizada por James Coburn e Maximilian Schell. O tema do filme, que se passa em 1943, é a busca, por parte de um oficial aristocrático, dessa tradicional medalha alemã, em contraponto a um cínico e cético sargento que já a tem. Desnecessário dizer, o roteiro é baseado em livro de ficção inspirado em fatos reais.

    Já o enredo do americano "Círculo de Fogo" ("Enemy at the Gates", 2001), dirigido por Jean-Jacques Annaud, passa-se durante a decisiva batalha de Stalingrado (agosto de 1942-fevereiro de 1943) e conta a história de um atirador de elite russo, Vasily Zaytsev (1915-91), que foi um dos mais espetaculares "snipers" de todos os tempos. Tendo o inglês Jude Law no papel principal, o filme mostra realisticamente o combate.

    Stalingrado foi a derrota alemã mais impactante na frente leste, um ponto de inflexão na guerra. Não por acaso, também foi tema do cinema alemão, o realista e depressivo "Stalingrado - Batalha Final" ("Stalingrad", 1993), dirigido por Joseph Vilsmaier.

    Mas talvez o mais famoso filme da Alemanha sobre a guerra seja "O Barco - Inferno no mar" ("Das Boot", 1981), dirigido por Wolfgang Petersen e baseado no romance com o mesmo nome, de Lothar-Günther Buchheim.

    O tema é a guerra marítima promovida pelos submarinos alemães contra a navegação aliada. A ameaça submarina era considerada por Churchill como o maior obstáculo para a vitória. Os submarinistas tiveram os maiores índices de baixas das forças armadas da Alemanha de Hilter.

    A guerra no mar também não é dos tópicos mais comuns na cinematografia da Segunda Guerra, mas alguns marcos históricos foram levados para a tela. "Afundem o Bismarck" ("Sink the Bismarck", 1960), por exemplo, trata da perseguição e destruição do grande couraçado alemão pela Marinha Real (britânica) em 1941.

    Apesar de o filme não ter tantas cenas de ação, nele o suspense é mantido pela dificuldade de encontrar e combater o grande navio no meio do Atlântico, com ênfase na ação dos oficiais em terra que planejaram a campanha.

    Já "A Batalha de Midway" ("Midway" 1976), trata da mais decisiva batalha naval da guerra no Pacífico entre Estados Unidos e Japão, com direito a um melodrama duvidoso -o romance entre um oficial americano e uma moça de origem nipônica. Como convém a um épico, o elenco é de medalhões, como Charlton Heston, Henry Fonda, James Coburn, Glenn Ford, Toshiro Mifune, Robert Mitchum, Cliff Robertson e Robert Wagner.

    A participação de atores japoneses evidencia uma mudança de enfoque no cinema do pós-Guerra, com o Japão passando a aliado dos EUA. O mesmo já tinha acontecido em filme anterior e com tema bem mais polêmico, "Tora! Tora! Tora!" (1970), sobre o ataque a Pearl Harbor. Essa coprodução EUA-Japão opta por um enfoque revisionista baseado na historiografia mais recente da época. Deixava-se, por exemplo, de culpar os comandantes do Exército e da Marinha dos EUA pelo desastre.

    CHARLIE

    "Adoro o cheiro de napalm pela manhã", disse o tenente-coronel americano Bill Kilgore assistindo ao bombardeio de uma aldeia vietnamita a beira-mar. É uma das frases clássicas do magistral"Apocalypse Now" (1979, dirigido por Francis Ford Coppola), sobre a guerra do Vietnã. A aldeia é atacada ao som de "Cavalgada das Valquírias" que sai dos helicópteros. E Kilgore ordena a seus soldados que surfem. Outra frase memorável da cena virou título de uma música do conjunto de rock britânico "The Clash": "Charlie Don't Surf" ("vietcongue não surfa" -o codinome dos americanos para se referir aos combatentes sul-vietnamitas era "Victor Charlie").

    Surreal? Não muito. Em 1983, uma coluna de blindados sul-africana avança em território angolano em direção a uma pequena cidade. Alguns dos veículos de "operações psicológicas" tocam em alto volume a música-tema do filme americano "Os Boinas Verdes" ("The Green Berets", 1968), com John Wayne, também passado no Vietnã.

    "A cidade foi tomada em uma atmosfera surreal, minha primeira impressão é de que era algo tirado de 'Kelly's Heroes' ", escreveu o militar sul-africano, referindo-se ao já citado filme com Telly Savallas na direção de um tanque.

    Bingo.

    RICARDO BONALUME, 54, é repórter da Folha.

    CAMILA SOATO, 30, é artista plástica e participa da mostra "Vértice" no Centro Cultural Correios do Rio até 13/12.

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024