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    BCE anuncia medidas audaciosas para estimular economia da zona do euro

    JACK EWING
    DO "NEW YORK TIMES", EM FRANKFURT (ALEMANHA)

    10/03/2016 17h14

    Boris Roessler - 21.jan.2015/Efe
    Banco Central Europeu vê riscos ao crescimento e à inflação na zona do euro
    Banco Central Europeu vê riscos ao crescimento e à inflação na zona do euro

    O BCE (Banco Central Europeu) tomou uma série de medidas inesperadas e radicais na quinta-feira (10) a fim de estimular a combalida economia da zona do euro –entre as quais, na prática, pagar aos bancos para que emprestem dinheiro.

    O aumento da penalidade que cobra dos bancos para manterem fundos em seus cofres virtuais, a chamada taxa de redepósito, já era esperado. O banco central surpreendeu os analistas e investidores, no entanto, ao afirmar também que ofereceria empréstimos com prazo de quatro anos aos bancos comerciais, sob um arranjo que pagaria juros aos bancos por dinheiro que emprestem a companhias e consumidores.

    O banco central anunciou ainda que expandiria suas compras de títulos do governo e outros ativos de € 60 bilhões para € 80 bilhões por mês. Em outro passo sem precedente para a zona do euro, o banco central também começará a comprar títulos empresariais, como parte de seu programa de aquisição de ativos.

    As ações são parte de um esforço cada vez mais urgente do banco central para dar à zona do euro um empuxo decisivo e tentar evitar a ameaça de um declínio destrutivo nos preços, conhecido como deflação.

    As medidas não deixam, porém, de acarretar riscos, e levam o BCE ainda mais longe nas águas jamais navegadas das taxas de juros negativas.

    A ação inesperadamente vigorosa pode também ser interpretada como sinal de que o BCE está mais preocupado do que os analistas imaginavam com o risco de deflação.

    "Isso parece trazer todos os sinais de uma ação radical do BCE para tentar resolver o problema", afirmou em comunicado Patrick O'Donnell, administrador de investimento na Aberdeen Asset Management.

    Em entrevista coletiva, Mario Draghi, presidente do BCE, definiu as medidas como "pacote abrangente", com o objetivo de estimular a inflação e a economia da zona do euro. "Mostramos que não nos falta munição", disse Draghi.

    TAXA DE REDEPÓSITO

    Em situações "normais", os bancos recebem juros pelo dinheiro que têm depositado no banco central. Mas, desde junho de 2014, o BCE começou, na prática, a penalizar os bancos por esses depósitos, cobrando uma taxa de juros negativa sobre eles.

    Na primeira medida anunciada nesta quinta, o BCE cortou a taxa de redepósito de -0,3% para -0,4%. Alguns analistas antecipavam corte ainda maior, para - 0,5%.

    A medida sinaliza a urgência do banco central quanto à situação econômica da zona do euro. Draghi declarou que a perspectiva do banco central quanto ao crescimento econômico mundial havia sido revisada "para ligeiramente menor" por conta da desaceleração na economia mundial e "dos riscos geopolíticos mais amplos".

    INFLAÇÃO

    A despeito das medidas de estímulo adotadas pelo banco até o momento, a inflação nos 19 países membros da zona do euro está perto ou abaixo de zero há mais de um ano. O índice de inflação, que vinha sendo ligeiramente superior a zero, foi a -0,2% em fevereiro, de acordo com dados oficiais.

    Realimentar a inflação é um dos principais objetivos de política monetária do BCE.

    A deflação acontece quando os consumidores postergam a compra, porque esperam que os preços caiam ainda mais, o que cria um círculo de queda de preços e de demanda. Quedas de preços representam sintoma de crescimento fraco, enquanto um declínio amplo e sustentado de preços pode resultar em diminuição no lucro das empresas e resultar em demissões.

    Não se pode afirmar que uma deflação tenha começado tecnicamente, porque as vendas do varejo vinham subindo ligeiramente na zona do euro. Mas as autoridades temem que ela possa surgir, e sabem que a deflação é uma condição debilitante e difícil de curar.

    Draghi disse que o banco central antecipava que a inflação ficaria em patamar negativo pelos próximos meses antes de voltar a subir a mais de zero no começo deste ano. Em dezembro, o BCE previa inflação de 1% para 2016.

    Agora, Draghi disse que a expectativa para o ano era de apenas 0,1%. A projeção do banco indica retomada da inflação no ano que vem, com 1,3%, e prevê 1,6% para 2018.

    JURO NEGATIVO

    Draghi e seus colegas no conselho do banco tiveram de explorar novas fronteiras da política monetária, em seu esforço para devolver a inflação a marcas próximas à meta de pouco menos de 2% anual adotada pelo BCE. O banco central não consegue atingir essa meta desde 2013.

    As taxas de juros negativas, que foram adotadas por alguns países de fora da zona do euro, como Suíça e Dinamarca, contrariam muitas suposições sobre a maneira pela qual o sistema financeiro funciona. Na zona do euro, essa tendência conduziu a taxas negativas para outros ativos, como os títulos do governo alemão e, recentemente, até títulos de emissores privados.

    Os investidores que compram esses títulos estão, na prática, pagando para estacionar seu dinheiro em um lugar que consideram seguro.

    Na terça-feira (8), o banco alemão Berlin Hyp emitiu € 500 milhões em títulos com taxa negativa de juro de 0,162%, O banco afirmou que a procura pelo título, principalmente da parte de outros bancos, era três vezes maior que a oferta.

    PAGAR PARA EMPRESTAR

    Economistas têm debatido os efeitos das medidas do banco central. Os juros negativos, por exemplo, podem prejudicar os lucros dos bancos, já que muitos deles estão sofrendo com maus empréstimos e ativos problemáticos.

    Talvez para ajudar a combater esse efeito negativo, o BCE anunciou que começaria a recompensar bancos que emprestem dinheiro. A medida, tecnicamente, envolve outra forma de juros negativos, sob a qual o banco central oferecerá às instituições uma taxa de até -0,4% por quatro anos.

    Em outras palavras, enquanto os juros negativos da taxa de depósito do BCE forçam bancos a pagar pelo dinheiro que depositam no banco central, os juros negativos sobre os empréstimos deste aos bancos representarão lucro adicional para os bancos comerciais quando eles colocarem esse dinheiro para circular na economia.

    APELO

    Faz quase um ano que o BCE criou um precedente na zona do euro ao começar a adquirir títulos e outros ativos públicos. O programa representava, essencialmente, uma forma de imprimir dinheiro na esperança de estimular a economia da zona do euro, que ainda não se recuperou plenamente da crise financeira de 2008.

    O programa de relaxamento quantitativo ajudou a manter o euro baixo diante do dólar, o que beneficia os exportadores europeus. E Draghi argumentou que isso torna mais fácil aos bancos fazer empréstimos.

    Mas, na quinta-feira, ele apelou aos governos da zona do euro, como já fez muitas vezes, para que façam sua parte no estímulo à economia, tomando medidas que elevem a produtividade e promovendo mudanças para melhorar o ambiente de negócios. Essas medidas, disse ele, deveriam incluir mais investimento em infraestrutura.

    "Todos os países", disse Draghi, "deveriam se esforçar por promover uma combinação de políticas fiscais mais favorável ao crescimento".

    O conselho de política monetária do BCE está dividido nos últimos anos, pelo que se sabe, quanto à agressividade das medidas a serem tomadas para estimular a economia. Perguntado na entrevista coletiva se a decisão do conselho havia sido unânime, Draghi respondeu que "a maioria a favor foi esmagadora".

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

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