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    Análise: Relação entre militares e islamitas é o maior enigma no Egito

    SALEM H. NASSER
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    16/12/2012 08h26

    Desde que teve início a sequência de revoltas no mundo árabe, há quase dois anos, o Egito tem nos brindado com uma série de enigmas.

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    Alguns dizem respeito ao futuro da sociedade egípcia e da sua organização política, outros ao futuro de seu posicionamento no jogo político regional e mundial.

    As respostas passam pela solução, ainda que parcial, de alguns quebra-cabeças sobre o presente, o cenário político egípcio atual e as posições dos vários atores --as divisões que os opõem e as alianças que os unem.

    Afinal, como caracterizar os eventos egípcios a cada momento dado? Será uma oposição entre forças remanescentes do regime anterior e forças revolucionárias?

    Ou será uma divisão entre islamitas e liberais? Ou uma disputa de poder entre militares e civis, ou entre os militares e a Irmandade Muçulmana? E quais as preferências dos atores externos e como estes exercem influência?

    Não se pode perder de vista que cada ator, considerando seus objetivos e tentando atingi-los, operará por vezes flutuações em seu comportamento e em suas alianças.

    Assim, por exemplo, liberais e islamitas estavam unidos na tentativa de derrubar o regime de Mubarak e agora estão se enfrentando sobre uma nova Constituição.

    De todos os enigmas persistentes nessa revolução egípcia, um dos mais obscuros é aquele que respeita às relações entre as duas forças políticas mais impressionantes daquele país: o establishment militar, herdeiro e centro do poder que comandou o Egito por quatro décadas, além de operador fundamental na economia, e a Irmandade, marginalizada pelas mesmas quatro décadas, mas cuja força se manifestou assim que houve eleições livres.

    No momento em que a posse de Mursi como presidente eleito era posta em dúvida e foi finalmente permitida, cada lado fazia uma aposta em que seria capaz de preservar o máximo do próprio poder ao mesmo tempo em que colocaria em xeque o do outro.

    Muito cedo, o presidente pareceu demonstrar o bem fundado da aposta da Irmandade ao demitir lideranças eminentes da cúpula militar.

    Desde então, no entanto, havia quem dissesse que havia uma articulação, um acordo, entre as duas forças, do qual o fortalecimento da figura do presidente podia ser parte integrante. Ou esse acordo se estaria fazendo com a própria cúpula ou diretamente com o corpo militar, independentemente da vontade da cúpula.

    Algumas indicações dessa articulação apareceram em várias ocasiões. A mais recente é a extensão dos poderes de polícia do Exército, concedido pelo presidente em meio à forte divisão que opõe seus partidários àqueles que rejeitam o regime de urgência em que se está tentando aprovar a nova Constituição.

    Mas o que pode fazer com que duas forças que a história de meio século do Egito deveria manter opostas encontrem interesses comuns e sejam levadas a cooperar?

    Uma pista para esse enigma particular pode ser esta: tanto os militares quanto a Irmandade Muçulmana têm interesse em que o poder continue concentrado e muito verticalizado, de modo a preservar a Irmandade de competição e preservar a dimensão do aparato militar como ator político e econômico.

    E, é claro, desde fora, muitos desejam essa centralização do poder para evitar os riscos de instabilidade que um país como o Egito, se não contido por uma mão forte, poderia trazer ao jogo de poder regional.

    SALEM H. NASSER é coordenador do Centro de Direito Global da GV

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