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    Não há o que comemorar, diz 'arquiteto' do acordo

    DIOGO BERCITO
    DO ENVIADO A HERZLIYA

    13/09/2013 03h04

    Yossi Beilin, apelidado "arquiteto dos Acordos de Oslo", está desgostoso. Em seu escritório em Herzliya, norte de Tel Aviv, ele diz que nem em pesadelos imaginaria que os projetos de paz que ajudou a articular em 1993 não seriam realidade, 20 anos depois.

    Diante de uma nova rodada de negociações, o político israelense -que hoje mantém uma empresa de consultoria internacional- espera que as lições do fracasso de Oslo sejam reaproveitadas.

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    Por exemplo, lembrar-se dos extremistas. "Há 20 anos, não levamos em conta a força das minorias, mas foram elas que tiveram o poder de se opôr ao plano de paz."

    Caso as rodadas de negociação falhem, o político tem uma sugestão: devolver as chaves do território palestino ao "ocupador". "Isso poria Israel em uma posição difícil, de ser o responsável por todos os setores, como educação e saúde", afirma Beilin.

    *

    Folha - Este é um aniversário para os Acordos de Oslo?

    Yossi Beilin - Não. Nem mesmo nos nossos piores pesadelos imaginávamos que os acordos se arrastariam por 20 anos. Comemorar essa data seria como celebrar a graduação de um estudante que ainda está na primeira série. Mas Oslo é, hoje, um ponto de referência para pensarmos no futuro.

    Em que sentido Oslo serve de modelo?

    Serve para entendermos que a maioria em ambos os lados é importante, mas não o suficiente. Há 20 anos, nós não levamos em conta a força das minorias, mas foram eles que tiveram o poder de ir às ruas e de se opôr ao plano de paz.

    A quem estamos nos referindo?

    Ao Hamas, do lado palestino, e à extrema direita, em Israel. Nós, os israelenses, não estávamos prontos para as manifestações e para o assassinato do premiê Yitzhak Rabin. Os palestinos também não estavam prontos para os homens-bomba do Hamas.

    Como levar isso em conta, diante da renovação das negociações de paz?

    A primeira medida a ser tomada é admitir que há extremistas. Estou cansado de ouvir que eles são minoria e que a maioria quer a paz. Uma pessoa sozinha pode impedir a vontade de todas as outras.

    A saída é trazer Hamas e extremistas israelenses às mesas de negociação?

    Não. Eles não podem se sentar para negociar. Eles são lunáticos. Mas temos de saber o que eles estão fazendo, por meio de Inteligência.

    O que foi concretizado em Oslo?

    Era uma solução interina. Reconhecer a autoridade dos palestinos, por exemplo, mas tendo em vista uma solução definitiva em até cinco anos. Isso era importante, mas não significava ter a paz. Tratar os Acordos de Oslo como um acordo de paz teve um grande impacto em Israel.

    Onde estava o erro?

    Foi um erro termos realizado a cerimônia em Washington com [o então presidente americano] Bill Clinton, por exemplo. Oslo deveria ter sido tratado pelo que era. A foto de Clinton com Rabin e Arafat foi o suficiente para o mundo crer que já havia a paz, o que não era verdade. Mas as pessoas nunca leem os acordos.

    Estabelecer um acordo temporário foi também um equívoco?

    Sim. Pedi que Rabin nos deixasse conversar sobre as questões reais, mas ele me disse que era melhor começarmos por um acordo interino para depois chegarmos a um definitivo. Permitimos, assim, que extremistas fizessem o que queriam. Caso a paz fosse um "fait accompli", eles poderiam espernear, mas não mudariam nada.

    Qual é a alternativa para essa situação?

    Os palestinos deveriam declarar que Oslo acabou para eles. Não pode ser uma desculpa para não seguir adiante. Que dissolvam a Autoridade Nacional Palestina e devolvam as chaves para os ocupadores. Isso poria Israel em uma posição difícil, de ser o responsável por todos os setores, como educação e saúde.

    É uma possibilidade real?

    Eu já disse isso a Mahmoud Abbas [presidente palestino]. Mas os palestinos não estão dispostos a ceder o poder, ainda que seja pequeno. Agora, com a retomada das negociações, não acho que Oslo deva ser cancelado. Mas, se as conversas falharem, poderia ser uma solução.

    Por que cancelar Oslo?

    Quem apoia hoje os Acordos de Oslo são os mesmos que se opuseram no início. Eles usam o acordo para proteger os assentamentos e para impedir as discussões a respeito das fronteiras. Os palestinos, por sua vez, se agarram ao fato de que têm um presidente, um premiê, um Orçamento, ministros etc. Para que mudar?

    Como o sr. avalia as negociações atuais?

    Caso termine em uma coletiva de imprensa anunciando o fracasso das negociações, a situação terá piorado. As relações vão deteriorar.

    O que fazer?

    Os americanos têm de fazer de tudo para prevenir esse fracasso. Caso percebam que os prospectos de paz são baixos, precisam fazer o que considero uma ideia ruim --um acordo interino.

    Mas, dessa vez, estabelecendo um Estado palestino imediatamente, com fronteiras temporárias, e se comprometendo em chegar a um acordo permanente, com um cronograma definido. Assim, o interino não se tornará permanente.

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