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    Entenda como a Coreia do Norte conseguiu criar míssil intercontinental

    DA ASSOCIATED PRESS

    05/07/2017 11h00

    Impedir que a Coreia do Norte desenvolvesse um míssil balístico intercontinental (ICBM) equipado com ogiva nuclear era há muito considerado um objetivo estratégico chave dos Estados Unidos, e uma linha vermelha à qual a Coreia do Norte expressa desrespeito há anos.

    O lançamento de um ICBM pelos norte-coreanos em 4 de julho é apenas o mais recente passo na longa marcha em direção a esse objetivo, que talvez tenha sido atingido.

    Mas embora o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, pareça ter sido apanhado um tanto desprevenido pelo lançamento, e questionado se o ditador norte-coreano, Kim Jong-un, não tem nada de melhor a fazer, Kim e seu regime vinham claramente telegrafando seus próximos passos.

    E uma coisa fica cristalinamente clara: a Coreia do Norte não tem a intenção de recuar.

    A Coreia do Norte declara ter o direito soberano desenvolver um arsenal nuclear dissuasório confiável, diante do que define como política hostil de seu maior inimigo, os Estados Unidos, e recusa estridentemente qualquer apelo para que abandone as armas nucleares e mísseis de longo alcance que representam a "espada preciosa" de sua defesa nacional.

    Os Estados Unidos não aceitam esse argumento. E dizem que todas as opções de reação estão em debate.

    AFP
    This picture taken and released on July 4, 2017 by North Korea's official Korean Central News Agency (KCNA) shows North Korean leader Kim Jong-Un (R) reacting after the test-fire of the intercontinental ballistic missile Hwasong-14 at an undisclosed location. North Korea declared on July 4 it had successfully tested its first intercontinental ballistic missile -- a watershed moment in its push to develop a nuclear weapon capable of hitting the mainland United States. / AFP PHOTO / KCNA VIA KNS / STR / South Korea OUT / REPUBLIC OF KOREA OUT ---EDITORS NOTE--- RESTRICTED TO EDITORIAL USE - MANDATORY CREDIT "AFP PHOTO/KCNA VIA KNS" - NO MARKETING NO ADVERTISING CAMPAIGNS - DISTRIBUTED AS A SERVICE TO CLIENTS THIS PICTURE WAS MADE AVAILABLE BY A THIRD PARTY. AFP CAN NOT INDEPENDENTLY VERIFY THE AUTHENTICITY, LOCATION, DATE AND CONTENT OF THIS IMAGE. THIS PHOTO IS DISTRIBUTED EXACTLY AS RECEIVED BY AFP. /
    O ditador Kim Jong-un comemora o lançamento do míssil Hwasong-14 nesta terça-feira (4)

    ANO-NOVO DE KIM

    Kim começou o ano com uma promessa pública de que lançaria o primeiro ICBM da Coreia do Norte.

    Ele o fez em seu discurso anual de Ano-Novo, um pronunciamento televisivo de 30 minutos no qual ele elogiava os cientistas do país pelo teste bem sucedido do que a Coreia do Norte afirma ser sua primeira bomba de hidrogênio, o segundo dos dois testes nucleares conduzidos pelo país em 2016, e em seguida acrescentou que os preparativos para lançar um ICBM haviam "chegado ao estágio final".

    Ele não declarou explicitamente que um teste de ICBM era iminente, Mas estava claro que expressou a possibilidade em busca de uma reação.

    Em 3 de janeiro, Trump reagiu: "A Coreia do Norte acaba de declarar que está nos estágios finais de desenvolvimento de uma arma nuclear capaz de atingir partes dos Estados Unidos. Isso não vai acontecer!"

    Poucos dias depois, um porta-voz do Ministério do Exterior norte-coreano declarou, por meio da mídia estatal do país, que um ICBM "será lançado no momento e no local determinados pelo quartel-general supremo" do país.

    Ash Carter, o secretário da Defesa norte-americano, respondeu que os Estados Unidos abateriam quaisquer mísseis norte-coreanos que parecessem estar a caminho de territórios norte-americanos e dos aliados de seu país.

    AMEAÇAS E PROVOCAÇÕES Desde abril, Coreia do Norte fez 6 testes de mísseis balísticos, quase sempre perto de datas ou eventos importantes para potências ocidentais

    AVANÇOS TECNOLÓGICOS

    De acordo com os norte-coreanos, março foi um mês de grande avanço para a indústria nacional de motores para foguetes.

    A Coreia do Norte conduziu um teste de solo de um novo tipo de propulsor de alto empuxo que Kim saudou como "grande evento de significado histórico" para a construção de foguetes e os esforços de desenvolver "armas estratégicas ao estilo coreano".

    O "mundo todo logo será testemunha da séria importância que tem a grande vitória conquistada hoje", ele acrescentou.

    O teste aconteceu quando o secretário de Estado norte-americano Rex Tillerson estava em viagem à Ásia, fazendo algumas das mais sérias advertências à Coreia do Norte desde a posse de Trump. "Estamos estudando uma nova gama de medidas diplomáticas, econômicas e de segurança", ele disse. "Todas as opções estão em debate".

    A Coreia do Norte, furiosa por conta de exercícios militares conjuntos entre a Coreia do Sul e os Estados Unidos, em 6 de março também conduziu um exercício militar importante que inclui o disparo de quatro mísseis balísticos de alcance intermediário que chegaram a 200 quilômetros da costa japonesa. O Japão serve como base a dezenas de milhares de militares norte-americanos.

    "A Coreia do Norte está se comportando muito mal", declarou Trump naqueles dias. "Eles vêm provocando os Estados Unidos há anos. A China pouco fez para ajudar".

    MÍSSEIS EM DESFILE

    As tensões chegaram a um pico em abril, quando imagens registradas por satélites indicaram que os norte-coreanos estavam preparando um teste nuclear subterrâneo.

    Com a chegada de uma força-tarefa encabeçada por um porta-aviões norte-americano à área e outra "armada" a caminho, de acordo com Trump, os dois lados trocaram acusações de uma escalada em direção à guerra.

    O confronto não aconteceu, mas a Coreia do Norte celebrou o 100º aniversário do nascimento de Kim Il-sung, avô de Kim Jong-un e o fundador do Estado, com um espetacular desfile militar que incluía o maior número de mísseis já exibidos pelo país, entre os quais modelos que jamais haviam sido mostrados ao público.

    Os dois veículos finais do desfilo eram longas plataformas móveis de lançamento de mísseis, transportando tubos camuflados. Esses tubos são usados para lançamentos de baixa visibilidade e, embora seu conteúdo não estivesse visível, muitos especialistas expressaram a opinião de que o tamanho sugeria que eles poderiam ser usados para transportar um ICBM ainda desconhecido.

    O desfile gerou interesse significativo entre os especialistas, que previram que um ICBM poderia ser lançado em breve.

    Lucy Nicholson - 30.mai.2017/Reuters
    People watch as the Ground-based Midcourse Defense (GMD) element of the U.S. ballistic missile defense system launches during a flight test from Vandenberg Air Force Base, California, U.S., May 30, 2017. REUTERS/Lucy Nicholson ORG XMIT: LUC08
    Pessoas observam lançamento de míssil interceptador na Califórnia, em maio

    TOQUES FINAIS

    Cada vez mais preocupados com o ritmo acelerado de lançamento de mísseis norte-coreanos, os Estados Unidos testaram seu sistema de defesa contra mísseis no fim de maio.

    Washington classificou o teste como um grande sucesso. O interceptador lançado de uma base na Califórnia "obliterou" um míssil simulado que estava em trajetória rumo aos Estados Unidos sobre o Oceano Pacífico.

    Os Estados Unidos contam com cerca de 450 desses mísseis, com alcance de 12.900 quilômetros, mas críticos do teste, que custou US$ 244 milhões, dizem que este não confirmou que os Estados Unidos seriam de fato capazes de interceptar um ICBM norte-coreano disparado em condições de guerra. Só quatro das nove tentativas de interceptação realizadas desde 2004 tiveram sucesso.

    O teste tampouco parece ter sido impacto sobre o calendário de testes da Coreia do Norte.

    Ainda que não tenha feito comentários oficiais no momento –e que Trump não tenha recorrido ao Twitter em resposta– a Coreia do Norte conduziu outro teste de propulsor no final do mês passado, que os Estados Unidos teriam identificado como provavelmente destinado a um ICBM.

    Àquela altura, já não restava muita dúvida.

    A Coreia do Norte estava avançando rapidamente para o cumprimento da promessa de Ano-Novo de Kim, e a janela de oportunidade para impedi-la de fazê-lo estava se fechando.

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

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