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    Coreia do Norte

    Problema de Kim Jong-un é Seul, não EUA, diz desertor da Coreia do Norte

    SILAS MARTÍ
    DE NOVA YORK

    19/10/2017 02h00

    "Um lado tem luz, e o outro, não", diz Ri Jong-ho. "Nas imagens aéreas, a Coreia do Sul brilha, enquanto o norte é um breu enorme."

    O dissidente do regime de Kim Jong-un fala da disparidade brutal entre a infraestrutura e a matriz energética dos dois países, a ditadura comunista de onde fugiu e o sul capitalista aliado dos EUA.

    Mas também poderia estar falando em termos mais gerais. De um lado, a civilização negada aos que vivem sob o domínio do "pequeno homem do foguete"; do outro, prosperidade de dar inveja.

    Na visão de Ri, ex-agente do alto escalão do governo de Kim que fugiu da Coreia do Norte há três anos e vive nos arredores de Washington, a chave para entender seu país está na tensão com os vizinhos, e não na troca de farpas entre o norte-coreano e o presidente americano.

    "Não se trata de uma beligerância de igual para igual", diz o dissidente. "É como uma criança brigando com um adulto. Kim Jong-un quer a ajuda americana."

    Ri acredita que as provocações do ditador norte-coreano têm como meta (um tanto improvável) a aproximação entre os dois países.

    "É uma estratégia para dizer que não queremos guerra, mas também que não temos medo e que não imploramos por liberdade. Se você atirar, vamos atirar de volta", resumiu, em encontro na Asia Society, em Nova York.

    "O programa nuclear não é para combater os EUA, mas para ser mais forte que a Coreia do Sul", afirma. "O Norte nunca respeitou as lideranças sul-coreanas."

    VIZINHO PRÓSPERO

    A animosidade em relação ao vizinho só aumenta. Ri conta que os norte-coreanos podem ter eletrodomésticos e outros objetos importados da China e do Japão, mas nada da Coreia do Sul.

    Ele lembra, aliás, que a queixa da elite local não é por estar engessada num padrão de vida inferior ao de outros países. O problema é estar abaixo dos vizinhos, que, na visão de parcelas mais esclarecidas, só chegaram lá por causa da aliança com os EUA.

    Ri poderia se encaixar nesse perfil. Depois de liderar empresas clandestinas do regime norte-coreano na China (posto para o qual fora apontado pelo pai do atual ditador, Kim Jong-il), o dissidente fugiu para Seul quando da onda de expurgos promovida pelo novo mandatário.

    Desde então, tudo parece pior. Ri acredita que as sanções recém-impostas pelas Nações Unidas à Coreia do Norte agravam a penúria.

    "Não há comida para todos", disse. "O país não vai sobreviver nem um ano com essas sanções, porque as pessoas vão começar a morrer. Toda a economia parou, estamos no pior ponto da relação com a China."

    Nesse sentido, a colaboração de Pequim com Washington, na visão do desertor, levanta suspeitas na Coreia do Norte, onde autoridades vêm perdendo a confiança em seu aliado mais rico e poderoso.

    O quadro de insegurança aumenta à medida que Trump e Kim sobem o tom das ameaças, embora uma guerra possa gerar consequências desastrosas dos dois lados.

    Na opinião de Ri, os norte-coreanos não querem tropas chinesas ou russas em seu território num eventual combate com os EUA.

    Toda cautela é pouca quando o líder do país é Kim Jong-un. O dissidente acredita que esforços diplomáticos serão inúteis por ali.

    "Os Estados Unidos querem trazer Kim à mesa de negociação, mas não penso ser possível negociar", diz Ri. "Nem os diplomatas sabem o que ele quer. Antes de negociar, devemos saber o que passa por sua cabeça."

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