O consumo de água na região metropolitana de São Paulo é hoje 25% inferior ao que seria se não existisse a crise hídrica. Ou seja, é óbvio que vivemos uma gravíssima escassez de água e a maior parte da população já reagiu diminuindo o consumo, antes mesmo de ser submetida a alguma restrição.
A mudança de comportamento quase sempre é motivada pela consciência da necessidade de enfrentar a pior seca da história, às vezes reforçada pelo desejo de aproveitar o bônus tarifário. Há casos em que a mudança ocorre compulsoriamente por efeito da diminuição da pressão nos canos da Sabesp durante algumas horas, o que dificulta que as caixas-d'água permaneçam sempre cheias.
Naturalmente, a Sabesp sabe que a redução de pressão pode causar transtornos à população. Essa redução, porém, é necessária para diminuir o vazamento das tubulações enterradas no solo. Trata-se de uma medida preventiva para evitar um mal maior, que seria a exaustão da pouca água ainda armazenada nos grandes reservatórios.
Para resolver de vez os vazamentos, seria preciso substituir todas as antigas tubulações. A Sabesp já está empenhada na tarefa, que inescapavelmente durará diversos anos. Para que se tenha ideia da magnitude do desafio, existem cerca de 64 mil quilômetros de tubos enterrados na região metropolitana, o equivalente a uma volta e meia em torno da Terra.
As redes são mantidas por algumas horas em baixa pressão, porém essa pressão é positiva –isso impede a entrada de água do solo nas tubulações e o consequente risco de contaminação. Como alternativa, há quem proponha o racionamento puro e simples, por exemplo por meio de um rodízio. Nessa hipótese, a despressurização atingiria toda a rede pelo menos por algumas horas, o que demandaria da Sabesp um monitoramento da qualidade da água ainda mais rigoroso.
Como é senso comum, à medida que a água vai se tornando escassa, é preciso utilizá-la com parcimônia para que no futuro não falte para atendimento às necessidades mais básicas. Por essa razão, os intervalos de tempo de pressão reduzida têm sido estendidos.
Em breve, a Sabesp disponibilizará em seu site e nas agências de atendimento ao consumidor um meio mais rápido de conhecer o horário de redução da pressão para cada local específico.
Para uma minoria da população (bem menos de 1%), formada em geral pelos que moram em pontos elevados e que não possuem caixa-d'água, a crise hídrica pode significar longas horas sem água nas torneiras. Em casos excepcionais, até mesmo alguns dias.
Não se trata apenas de residências modestas. Também há estabelecimentos de grande porte que não têm caixa-d'água, em contradição com as normas municipais. A prioridade máxima da Sabesp é solucionar esses problemas localizados. E assim será feito, inclusive por meio da doação de caixas-d'água para as famílias de baixa renda.
Há também uma parte significativa da população que ainda não está consciente da gravidade da situação e que insiste em não mudar de hábitos. Alguns até aumentaram o consumo. Esses devem ser convencidos a mudar de comportamento, tanto pela ação dos familiares como pela dor no bolso causada pela imposição da sobretaxa.
Pode-se descrever essa situação como a de um racionamento? Depende. Para quem pertence à minoria que, neste momento, não tem água em casa, a resposta é certamente positiva.
Porém, o termo "racionamento" é usado, em geral, quando se força a diminuição coletiva do consumo por meio da total interrupção do fornecimento por algumas horas do dia ou quando se impõem quotas individuais de consumo. Não é o que a Sabesp tem feito, mas poderá ser forçada a fazê-lo, se continuar a não chover nos lugares certos e nas quantidades necessárias.
É evidente que, na crise atual, a Sabesp não tem como prestar o serviço como se a situação fosse de normalidade. Não é sensato brigar com os fatos. Se for necessário chamar isso de racionamento, que assim seja. O relevante é impedir que ações na Justiça, de proteção a supostos direitos individuais, atentem contra a segurança hídrica de todos.
JERSON KELMAN, 67, engenheiro civil, é presidente da Sabesp
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