• Opinião

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    MARIA DO ROSÁRIO RAMALHO E MAURICIO DANTAS

    O rebaixamento do debate público da cultura

    01/11/2017 02h00

    Divulgação
    Maria do Rosário Ramalho em cerimônia de posse como secretária de Cultura de São Paulo
    A ex-secretária de Cultura Maria do Rosário Ramalho (gestão Haddad), na cerimônia de posse, em 2016

    Em entrevista a esta Folha (24/10), o secretário de Cultura do prefeito João Doria (PSDB), André Sturm, tenta justificar seus inúmeros conflitos com o setor cultural acusando a gestão anterior (Fernando Haddad) de aparelhamento político e de ter como foco apenas os coletivos artísticos e não o cidadão e a relação com a sociedade.

    "Havia um aparelhamento. Ao assumir, troquei poucos cargos [...] Em fevereiro tive de exonerar um monte de gente. Ficavam boicotando. O interesse não era a cultura, mas a política. Havia um jogo do contra [...] O que acho mais crítico é que a secretaria tem de ter o cidadão como foco principal. O foco tem de ser a relação com a sociedade [...] Na gestão passada, não havia essa preocupação. O foco era a relação com os coletivos artísticos", disse Sturm.

    O "Diário Oficial" desmente o secretário. Por solicitação da gestão Doria, 58 funcionários comissionados da secretaria —a maioria dos coordenadores, dos diretores de departamentos, dos coordenadores de casas de cultura, além de alguns funcionários administrativos— foram exonerados (Diário Oficial, 31/12/2016), iniciando um desmonte da Secretaria de Cultura.

    A decisão surpreendeu, pois, até então, a transição transcorria com total colaboração da nossa gestão.

    O secretário havia manifestado a intenção de dar continuidade ao trabalho exitoso realizado pela secretaria, cuja equipe, altamente qualificada, se formou ao longo de décadas, atravessando gestões de diferentes partidos, a maioria sem qualquer relação com o PT.

    Nunca existiu aparelhamento na Secretaria de Cultura. Talvez o secretário confunda procedimentos administrativos complexos, que são obedecidos pelos funcionários, com boicote.

    A equipe foi reduzida de 2.100 funcionários (2007) para 1.600 (2016). Com muito esforço e racionalização administrativa conduzidos pela gestão passada, foi possível, no entanto, dar conta do enorme crescimento dos programas e atividades culturais.

    No fomento às linguagens artísticas e cidadania cultural, entre 2012 e 2016, o orçamento elevou-se de R$ 36,7 milhões para R$ 76,24 milhões, sendo que só para a cultura periférica o aumento foi de R$ 3,8 milhões para R$ 17,6 milhões.

    Mas a gestão Haddad nunca deixou de atender às demandas dos cidadãos e da sociedade, como demonstrou a pesquisa Ibope/Nossa SP, que apontou a área cultural do município como a mais bem avaliada pela população em 2016.

    Após dez meses de gestão, em vez de atacar, o secretário deveria enfrentar as atuais dificuldades, em boa parte criados pelo prefeito ou por ele mesmo.

    Entre os problemas estão o contingenciamento de 43% do orçamento da cultura (anunciado em janeiro, que foi o estopim do descontentamento dos coletivos); o apagamento de grafites; a paralisação ou alteração de programas em meio a processos seletivos; a interferência nas comissões de seleção idôneas; e a ausência de diálogo ou arrogância no trato com funcionários da secretaria e artistas.

    São essas as questões, e não o aparelhamento e a partidarização, que explicam as manifestações de descontentamento do setor cultural, em especial da cultura periférica, com a secretaria.

    MARIA DO ROSÁRIO RAMALHO foi secretária de Cultura de São Paulo (2016, gestão Haddad)
    MAURICIO DANTAS foi secretário-adjunto de Cultura de São Paulo (2016, gestão Haddad)

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