A recente tramitação no Congresso do projeto que criou o Ministério da Pesca escondeu uma batalha em que a Frente Parlamentar Evangélica se saiu vitoriosa --e rendeu críticas ao governo por parte de grupos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (LGBT).
O descontentamento não se referia ao novo ministério. O texto também tratava das atribuições da Secretaria Especial de Direitos Humanos e descrevia, entre os grupos atendidos, a população LGBT. Previa ainda a criação de um Conselho LGBT no governo.
Depois do debate na Câmara, o texto final excluiu o termo LGBT --citava apenas "minorias". O Conselho LGBT também não foi aprovado.
A mudança foi comemorada por congressistas ligados a igrejas evangélicas. Para grupos LGBT, o governo "rifou" reivindicações do movimento para aprovar o restante do projeto --além do Ministério da Pesca, tratava da área ambiental e criava cargos em comissão.
Segundo Míriam Martinho, da Rede Um Outro Olhar, o texto aprovado mantém os movimentos, que lutam por visibilidade, invisíveis. "Será uma comissão enrustida [o Conselho contra Discriminação]", disse.
O estilista Carlos Tufvesson, integrante do Conselho dos Direitos LGBT do Rio de Janeiro, diz que o governo não tem interesse em priorizar a luta LGBT. "O governo, na sua atividade legislativa, não apoia os pleitos LGBT. Entram milhões de barganhas nas negociações."
Já Luiz Mott, fundador do grupo Gay da Bahia, afirma que é um governo de "boas intenções e poucas ações".
O responsável pelas políticas LGBT na Secretaria de Direitos Humanos, Eduardo Santarelo, reconhece que as expressões relativas ao grupo foram retiradas por pressão dos evangélicos. "Qualquer menção no projeto de lei que tivesse a questão LGBT e o combate à homofobia, eles cortaram. Teve-se que negociar para aprovar o projeto como um todo", disse ele.
Homofobia
Encarada como a maior vitória LGBT no Congresso, a proposta que criminaliza a homofobia poderá se transformar em um novo revés para esses movimentos. Aprovado na Câmara por um "descuido" da bancada evangélica, o texto precisa passar pelo Senado sem emendas.
Caso contrário, volta à Câmara, onde vai "dormir em berço esplêndido", como disse aos colegas a relatora do tema, senadora Fátima Cleide (PT-RO). Depois de mais de um ano de negociação, ela já fala em fazer substitutivos ao texto para tornar viável sua aprovação.
Uma das principais objeções dos senadores ligados a igrejas é o artigo que pune discriminação a manifestações públicas de afeto. Outro ponto polêmico é a interpretação de que pastores não poderão mais condenar a homossexualidade em programas de rádio e televisão.
O senador Marcelo Crivella (PRB-RJ) afirma que é a favor dos direitos de homossexuais, mas é preciso "preservar o livre exercício do culto religioso".
Nos grupos LGBT, há quem defenda a votação sem modificações. Outros preferem mudanças no texto que garantam aprovação. "É melhor que ele [o projeto] seja votado e rejeitado. Vai ter de haver o custo político de rejeitar", diz Tufvesson.
O presidente da Associação Brasileira LGBT, Toni Reis, defende diplomacia e mobilização. "Precisamos ter mais força dentro do Congresso", diz.