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    Cidadãos vestiram preto em protesto a Fernando Collor de Mello; leia trecho

    da Folha Online

    28/08/2009 10h26

    Em 1992, o então presidente da República Fernando Collor de Mello, enfrentando as acusações que mais tarde lhe custariam o impeachment, conclamou a população a sair às ruas vestida de verde e amarelo, em sinal de apoio. O que se viu, no entanto, foi justamente o contrário: a maioria dos brasileiros que tomou partido neste histórico domingo preferiu o preto, como forma de protesto.

    Diversos jornais e veículos de comunicação fizeram com que isso acontecesse, publicando editoriais ou demonstrando posições que incentivavam ao uso de roupas e tecidos negros. A "Folha da Tarde" foi ainda mais ousada: além de publicar um editorial intitulado "Preto do luto e da vergonha", foi às bancas, no sábado de 15 de agosto, com a capa ostentando um fundo negro com letras brancas.

    O jornalista Roberto Hirao, que na época era ombudsman do periódico, registrou o episódio, já se preparando para receber muitos telefonemas de leitores com comentários sobre esta atitude. Esta e outras 69 colunas que ele publicou nos pouco mais de dois anos em que esteve responsável pela função estão na obra "70 Lições de Jornalismo" (Publifolha, 2009).

    Leia a seguir a íntegra do texto "Preto e Branco", em que Robeto Hirao comenta reportagens publicadas na "Folha da Tarde" na semana em questão, ou clique aqui para saber mais sobre a obra:

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    PRETO E BRANCO2

    Divulgação
    Colunas dão lições de jornalismo e registram fatos históricos do Brasil
    Colunas dão lições de jornalismo e registram fatos históricos do Brasil

    A Folha da Tarde rompeu seu esquema gráfico e surpreendeu os leitores com uma ousadia na capa da edição de sábado. Para se contrapor ao verde e amarelo que o presidente Collor invocou aos berros na quinta-feira, o jornal saiu com a capa coberta de preto. "Preto do luto e da vergonha", segundo o editorial da edição.

    Hoje, excepcionalmente, o ombudsman estará atendendo a partir das 9h os leitores que quiserem dar sua opinião sobre a posição adotada pelo jornal e sobre o editorial "Preto do luto e da vergonha".

    CONFIRA SE CONFERIU3

    Houve época em que incêndios eram "debelados pelos heroicos soldados do fogo", doadores de sangue iam aos nosocômios para depositar um pouco de seu "precioso líquido" e jovens "inseridos no contexto" debatiam com causídicos temas que geravam polêmica. Essas expressões carregadas de exagero desapareceram dos jornais. O moderno texto jornalístico não recorre a chavões, evita a adjetivação e se caracteriza pelo despojamento e facilidade de compreensão.

    Os chavões se foram, mas os modismos permanecem. De vez em quando algumas palavras "pousam" na cabeça de algum redator, viram moda e são usadas à exaustão, até sumirem desgastadas pelos excessos. Uma dessas palavras "frequentou" os jornais no ano passado: detonar. Detonava-se de tudo, de projetos do governo a filmes, novelas e o noticiário policial. Detonar veio logo depois de "imperdível", que começou nos comentários de filmes e se espalhou por outras editorias. Todo filme que "caía no gosto" do crítico era "imperdível".

    O hit deste ano é o verbo "conferir". Seu significado é amplo, mas na essência quer dizer verificar se está certo. Também começou a aparecer nos textos de variedades ("confira os ganhadores do Oscar...") e invadiu jornais, revistas, rádio, televisão e até anúncios. Se a chamada manda o leitor conferir uma notícia, pressupõe-se que pode haver algum erro nesse texto.

    A língua é dinâmica, sofre mutações ao longo dos anos, incorpora novas palavras, como taxista (antigamente era chofer). O ombudsman recorre a outra palavra da moda overdose para prever que "conferir" não demora para sair da moda. O excesso é gritante: só a Folha de S.Paulo usou "conferir" quatro vezes seguidas na primeira página (edições dos dias 11, 12, 13 e 14). A Folha da Tarde mandou o leitor "conferir uma promoção nos shoppings" na primeira página da edição do dia 8. A palavra apareceu várias vezes em textos internos. Pode conferir.

    Confira as promoções dos shoppings

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    "Overdose" de "confira" nas capas dos jornais

    FRASES DA SEMANA

    "Pedro que amava PC que amava Ana que amava Cláudio que amava Najum que amava Collor, que não ama ninguém"

    Versão satírica do poema "Quadrilha", de Carlos Drummond de Andrade, exibida numa das faixas carregadas por estudantes em manifestação pelo impeachment do presidente Collor, na terça-feira

    "Eu só vim porque a Folha da Tarde está aqui, senão eu não viria"

    Deputado Luiz Carlos da Silva, líder do PT na Assembleia Legislativa, ironizando a campanha da Folha da Tarde contra a semana de dois dias pretendida pelos parlamentares

    17/8/92

    2 Em 29 de setembro de 1992, a Câmara dos Deputados aprovou o impeachment de Fernando Collor de Mello e o afastou do poder, com 441 votos contra 38. Apesar de o então presidente ter renunciado três meses depois, antes da votação no Senado, teve seus direitos políticos cassados por oito anos.

    3 O título original foi: "Confira se detonou".

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    "70 Lições de Jornalismo"
    Autor: Roberto Hirao
    Editora: Publifolha
    Páginas: 216
    Quanto: R$ 29,90
    Onde comprar: pelo telefone 0800-140090 ou pelo site da Livraria da Folha

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