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    Herdeiros brigam na Justiça por fazenda deixada por Médici

    CRISTINA GRILLO
    DO RIO
    JOÃO CARLOS MAGALHÃES
    DE BRASÍLIA

    26/04/2013 03h15

    Uma disputa entre os herdeiros de Emílio Garrastazu Médici, presidente do país durante o período mais violento e economicamente próspero da ditadura militar no país (1969-1974), começou a ser julgada nesta semana pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).

    Neta do ex-presidente, Cláudia Candal Médici, 51, quer que a Justiça reconheça o direito dela a dividir, em igualdade de condições, a herança de sua avó, Scylla, com Roberto, seu pai, e os herdeiros de Sérgio, seu tio, morto em 2008 --o caso foi revelado pelo jornal "O Globo".

    Isso porque em 1984, um ano antes da morte do avô, Cláudia foi adotada por Médici e Scylla.

    Assim, Cláudia, Roberto e Sérgio se tornaram irmãos e teriam direitos iguais na divisão do que, segundo os advogados de Cláudia, é o único bem em jogo: uma propriedade rural em Bagé (RS), terra natal de Médici.

    Folhapress - 23.out.1969
    O então presidente Emílio Garrastazu Médici desce escadaria do Palácio Laranjeiras com a mulher, Scyla
    O então presidente Emílio Garrastazu Médici desce escadaria do Palácio Laranjeiras com a mulher, Scyla

    A disputa judicial começou somente depois da morte da viúva de Médici, em 2003. Cláudia resolveu ir à Justiça para ser incluída entre os herdeiros do casal.

    Decisão de primeira instância do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro deferiu em parte o pedido de Cláudia: ela poderia ser incluída entre os herdeiros de Scylla, mas não de Médici.

    O motivo: Médici morreu em 1985, quando a Constituição em vigor não dava os mesmos direitos a filhos biológicos e adotivos --o que foi mudado em 1988.

    PENSÃO

    Tio de Cláudia, Sérgio Nogueira Médici, recorreu da decisão. A defesa dele argumentou que a adoção tinha sido feita só para que a neta ficasse com a pensão de militar do avô, quando este morresse.

    Àquela época, filhas podiam ser beneficiárias e receber pensão de pai militar, direito que foi extinto em 1988.

    Em seu recurso, Sérgio Médici informou ainda que a "sobrinha-irmã" "sempre viveu e foi criada no núcleo familiar de seus pais biológicos, inclusive com eles residindo e sendo por eles sustentada, não existindo relação de dependência econômica dos avós, que sempre a trataram como neta, e não como filha".

    O processo de inventário mostra uma série de divergências entre os filhos de Médici, grande parte delas relativas a reclamações de Sérgio que acusava Roberto de não prestar contas dos ganhos com a venda de safras de arroz da fazenda de Bagé.

    RELAÇÕES ROMPIDAS "Houve uma briga entre Roberto e Sérgio por causa do inventário. Eles romperam relações e, como contra-ataque, Roberto instigou a filha a se habilitar como herdeira", disse Marcelo Campos de Carvalho, advogado da Martha Regina, viúva de Sérgio.

    Procurada em sua casa, Cláudia não respondeu aos telefonemas da Folha para dar sua versão.

    A Justiça deu razão aos argumentos de Sérgio, excluindo Cláudia da divisão da herança. A "filha-neta" recorreu ao STJ. Na terça-feira, o relator do processo, ministro Raul Araujo, votou a favor de Cláudia, mas o julgamento foi interrompido com um pedido de vista --não há data para que volte à pauta.

    As mesmas acusações de seu "tio-irmão" fizeram com que Cláudia fosse alvo de outra ação, esta movida pela União, que a acusava de ter utilizado a adoção como forma de fraudar a lei previdenciária para receber a pensão do avô.

    A Justiça já decidiu em definitivo que Cláudia tem direito à pensão, cujo valor seus advogados não souberam precisar. Como comparação, o comandante do Exército, Enzo Peri, recebeu no mês passado R$ 9.387 líquidos.

    Médici foi presidente entre 1969 e 1974, quando a ditadura esmagou violentamente quase toda a resistência contra o regime e, simultaneamente, produziu o chamado "milagre econômico", durante o qual o PIB brasileiro cresceu a índices quase sempre superiores a 10% ao ano.

    Colaborou FABIO BRISOLLA, do Rio

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