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    Kennedy cogitou ação armada para depor João Goulart

    DE SÃO PAULO

    06/01/2014 08h39

    Semanas antes de ser assassinado no Texas, em novembro de 1963, o presidente americano John Kennedy indagou em reunião na Casa Branca se os Estados Unidos poderiam "intervir militarmente" no Brasil para depor o presidente João Goulart (1919-1976).

    A pergunta de Kennedy, feita ao embaixador americano no país, Lincoln Gordon, é reveladora de como os EUA cogitavam uma ação armada para ajudar os golpistas a derrubar o presidente brasileiro.

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    A ação, contudo, acabou sendo desnecessária: bastou o apoio diplomático norte-americano para tornar bem-sucedida a conspiração que derrubou o governo de João Goulart entre 31 de março e 1º de abril de 1964, instaurando uma ditadura militar que duraria 21 anos.

    A indagação de Kennedy, documentada em uma gravação realizada pelo próprio americano, foi revelada nesta segunda-feira (6) pelo site "Arquivos da Ditadura", que foi ao ar com documentos sobre o período reunidos ao longo de décadas pelo jornalista Elio Gaspari, colunista da Folha.

    A informação é uma das novidades da reedição de "A Ditadura Envergonhada", primeiro volume da série de Gaspari. Ao contrário do que muitos pensavam, a posição americana em relação ao golpe brasileiro foi definida por Kennedy, e não por seu sucessor, Lyndon Johnson, que prontamente reconheceu o governo golpista em 1964.

    Em reunião realizada na Casa Branca nos dias 7 e 8 de outubro de 1963, John Kennedy e seus principais assessores discutiram o futuro de Brasil e Vietnã. Sobre a mesa, a possibilidade de golpes de Estado nos dois países. No dia 7, Kennedy conversou longamente sobre a situação brasileira com o embaixador Lincoln Gordon, que servia no Brasil desde 1961 e era um frequente interlocutor dos conspiradores.

    editoria de Arte/Folhapress

    Após ouvir do embaixador sobre o cenário no Brasil, Kennedy o indaga: "Você vê a situação indo para onde deveria, acha aconselhável que façamos uma intervenção militar?". O embaixador afirma que eles trabalhavam com um cenário de intervenção caso Jango desse uma guinada à esquerda.

    Quarenta e seis dias após a reunião, Kennedy seria assassinado a tiros em Dallas, Texas. Assumiria o vice Lyndon Johnson, que apenas seguiu com o roteiro já definido pelo antecessor. Como se sabe, a intervenção americana não foi necessária. Os EUA fizeram a operação "Brother Sam", em que disponibilizou apoio logístico para o caso de guerra civil.

    "Lyndon Johnson apenas deu o sinal verde, o Kennedy já tinha deixado tudo pronto", afirmou o historiador Luiz Alberto Moniz Bandeira. Para o também historiador Carlos Fico, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, a gravação da reunião em Washington confirma o teor de outros documentos que mostram como o golpe brasileiro era incentivado pelos EUA pelo menos desde 1962.

    O site "Arquivos da Ditadura" foi elaborado pela editora Intrínseca, que a partir de fevereiro relançará os quatro livros que Gaspari escreveu até agora sobre o período. Os documentos foram usados pelo jornalista para escrever os livros. É a primeira vez que esse arquivo é disponibilizado na internet.

    MANDATO DE JANGO

    Na presença dos três chefes das Forças Armadas e da presidente Dilma Rousseff, o Congresso Nacional devolveu, simbolicamente, no dia 18 de dezembro de 2013, o mandato do ex-presidente João Goulart. O presidente do Congresso, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), fez um pedido de desculpas "pelas inverdades praticadas pelo Estado brasileiro" contra um "patriota".

    A cerimônia oficializa decisão tomada no em novembro do ano passado por deputados e senadores que anulou a sessão de 2 de abril de 1964 do Congresso. Na ocasião, o então presidente do Congresso Nacional declarou vaga a Presidência da República –Goulart foi deposto pelo golpe militar de 1964. O argumento usado na ocasião foi de que o então presidente estava fora do país.

    A proposta de devolver o mandato foi apresentada pelos senadores Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) e Pedro Simon (PMDB-RS). No pedido, os congressistas afirmaram que a anulação faz um "resgate histórico" porque a vacância permitiu o golpe militar de 1964, embora Jango estivesse em Porto Alegre (RS). A ideia, de acordo com os parlamentares, seria retirar qualquer "ar de legalidade" do golpe militar de 1964.

    RESTOS MORTAIS

    Em novembro do ano passado, os restos mortais do ex-presidente foram exumados e levados a Brasília para perícias e homenagens. Amostras coletadas na capital federal serão analisadas em laboratórios fora do país.

    O objetivo é apurar a causa da morte de Jango, como ele era conhecido. Na época, foi divulgado que ele morreu devido a um infarto, mas familiares e o governo federal suspeitam que ele tenha sido envenenando por agentes ligados à ditadura militar (1964-85).

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