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    Lava Jato

    Duque recebeu arte como propina, diz PF

    MARIO CESAR CARVALHO
    DE SÃO PAULO
    FABIO BRISOLLA
    DO RIO

    29/03/2015 02h00

    Nos manuais clássicos de lavagem de dinheiro, obra de arte é comprada para transformar recurso ilícito num bem regular, de modo a apagar a origem criminosa do dinheiro. Nisso, o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque inovou, segundo a Polícia Federal. Com ele, a obra de arte era o próprio suborno, afirmam.

    Uma escultura do artista Franz Krajcberg, 93, comprada em 2012 por R$ 212,5 mil pelo empresário Milton Pascowitch, foi encontrada no último dia 16 na casa de Duque junto com outras 130 obras. Pascowitch é investigado na Operação Lava Jato sob suspeita de repassar propina na diretoria que Duque ocupou entre 2003 e 2012.

    A escultura, avaliada em R$ 250 mil hoje, só não foi levada para o Museu Oscar Niemeyer, em Curitiba, junto com outras porque havia risco de danificá-la.

    A PF também achou a nota fiscal de uma tela de Alfredo Volpi (1896-1988), comprada por R$ 400 mil por um outro suspeito de intermediar suborno na Petrobras cujo nome é mantido em sigilo. A obra de Volpi, porém, não foi achada.

    A PF instaurou um inquérito para investigar a suspeita de que as 131 obras foram usadas para lavar dinheiro, de acordo com o delegado Márcio Anselmo.

    Duque foi preso pela segunda vez no dia 16, acusado de transferir cerca de R$ 70 milhões de uma conta atribuída a ele na Suíça para Mônaco. Os recursos foram bloqueados no Principado.

    FALSIFICAÇÕES

    As 131 obras estavam espalhadas pela casa de Duque, na Barra (zona sul do Rio). Algumas estavam num cômodo secreto, construído atrás de um armário embutido, só aberto com controle remoto.

    Como o local parecia um bunker e havia obras de artistas em tese valiosos, como Miró, Chagall e Guignard, a coleção foi associada a milhões.

    Pura bobagem, na avaliação de quatro dos principais leiloeiros de arte do país –Evandro Carneiro, James Lisboa, Jonas Bergamin e Soraia Cals. Os trabalhos de Miró e Chagall são gravuras e podem ser compradas por R$ 20 mil, de acordo com eles.

    Fora a escultura de Krajcberg, um polonês naturalizado brasileiro, as 130 obras de Duque valem de R$ 200 mil a R$ 250 mil, estimam Lisboa e Bergamin, que as avaliaram a partir de fotos obtidas pela Folha. O conjunto valeria no máximo R$ 500 mil, não os R$ 80 mil declarados no Imposto de Renda por Duque.

    Soraia, que não quis avaliar as telas de Rubens Gerchmann sem ver as obras apreendidas, estima o resto do conjunto em R$ 50 mil.

    "Essa coleção é um rebotalho. São quadros de feira, de terceira. Não deveriam estar num museu. O conjunto não vale R$ 200 mil porque tem muita falsificação e reprodução", diz Bergamin.

    Por causa do baixo valor, segundo ele, não faz sentido falar em lavagem de dinheiro. Esse crime ocorre quando uma obra de alto valor é comprada para dar aparência legal a recursos ilícitos, o que pode ter ocorrido com o Krajcberg.

    As obras que seriam as mais valiosas do conjunto, os 11 trabalhos de Guignard, têm todos os indícios de que são falsas, segundo James Lisboa.

    A química Claudina Moresi, que durante dez anos pesquisou obras de Guignard em um projeto da Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas, diz: "A maioria das obras me causou estranhamento porque não parece Guignard. O traço é grosseiro, falta leveza na composição. Mas para dizer que é falso teria de analisar a obra".

    A forma como Duque comprou a maioria das obras, leilões na internet, reforça a suspeita. É um meio repleto de falsários, dizem os leiloeiros.

    OUTRO LADO

    O advogado de Duque, Alexandre Lopes, refuta a suspeita de que a escultura de Krajcberg foi propina. "Ele não recebeu valores indevidos em forma de arte. Isso será explicado no momento certo".

    Lopes diz que há muitas "réplicas" na coleção. "Qualquer cidadão de classe média poderia comprar essas obras. Não tem nada de milhões".

    O leiloeiro Aloisio Cravo diz que Pascowitch é seu cliente e que a escultura de Krajcberg foi vendida com nota e atestado de autenticidade. Pascowitch não foi encontrado.

    Editoria de Arte/Folhapress

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