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    o impeachment

    Dois meses antes de se suicidar, Getúlio venceu o impeachment

    OSCAR PILAGALLO
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    17/04/2016 02h00

    Divulgação
    Getúlio Vargas (ao microfone) em cena do documentário "Imagens do Estado Novo"
    Getúlio Vargas (ao microfone) em cena do documentário "Imagens do Estado Novo"

    Em junho de 1954, dois meses antes de se suicidar, Getúlio Vargas enfrentou um processo de impeachment na Câmara dos Deputados, uma das várias tentativas da oposição conservadora de afastar o presidente trabalhista acusado de corrupção.

    O episódio entrou para a história como uma nota de rodapé por dois motivos.

    Em primeiro lugar, porque a forte turbulência política nas semanas seguintes se encarregou de relativizar a importância do que aconteceu antes. Em segundo lugar, porque o processo sofreu derrota acachapante.

    No dia 19 daquele mês, 136 parlamentares votaram contra o impeachment e só 35 se manifestaram a favor do afastamento do presidente. Getúlio Vargas nem demonstrou ânimo para comemorar o resultado.

    Tinha consciência de que as investidas da UDN (União Democrática Nacional) não se encerrariam com o placar desfavorável, como de fato aconteceu.

    As acusações de crime de responsabilidade eram tão vagas que até alguns dos mais ilustres udenistas não as endossavam.

    Um deles era o professor de direito constitucional Afonso Arinos, para quem o requerimento não tinha bases razoáveis e consistiria numa aventura destinada ao fracasso.

    Arinos queria derrubar Getúlio, mas achava que um pedido desastrado de impeachment seria um tiro pela culatra, uma vez que a provável derrota no plenário fortaleceria o presidente.

    Não era assim, no entanto, que raciocinavam membros mais influentes do partido. Para eles, o impeachment, mesmo derrotado, abriria espaço para um golpe, com o apoio dos militares.

    ESTRATÉGIA

    A estratégia foi exposta com clareza pelo brigadeiro Eduardo Gomes, que tentara, sem êxito, se eleger presidente e sempre se apresentava como candidato dos conservadores.

    "Isso é necessário para que se forme, no meio militar, a consciência de que não há solução legal", disse, de acordo com registro de Lira Neto, biógrafo de Getúlio.

    "Pelo raciocínio assumido por Eduardo Gomes", conclui o escritor, "uma vez esgotados os recursos pelas vias institucionais, só haveria uma forma de afastar Getúlio Vargas de uma vez por todas do Catete, como eles tanto desejavam –o golpe militar."

    O pedido de impeachment foi protocolado no início de maio de 1954, logo depois que Getúlio, já isolado e tentando governar com o apoio das massas, anunciou que dobraria o salário mínimo.

    A biografia do autor da denúncia que deu origem ao requerimento seria suficiente para sugerir a inconsistência da peça. Tratava-se de um cabo eleitoral de Eduardo Gomes que, quando vereador do Rio, apresentou projeto para criar incentivos a famílias com pais e filhos sadios, em detrimento das que tivessem algum doente incurável.

    Quanto ao texto, referia-se a crimes como má execução orçamentária e improbidade administrativa. Embora o relator do processo, um deputado do PTB, tenha pedido o arquivamento da denúncia, ela foi submetida ao plenário.

    O resultado foi a segunda vitória do presidente contra o golpe tentado nos limites constitucionais. A primeira fora obtida no final do ano anterior, em uma Comissão Parlamentar de Inquérito.

    A CPI, de grande repercussão, chegou à conclusão de que o presidente não havia interferido no empréstimo irregular do Banco do Brasil ao jornal "Última Hora", o único que o apoiava.

    A questão é que o desfecho da crise se deu além dos limites constitucionais.

    OSCAR PILAGALLO é jornalista e autor dos livros "A História do Brasil no Século 20" (Publifolha) e "História da Imprensa Paulista" (Três Estrelas)

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