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    Bolsonaro admitiu atos de indisciplina e deslealdade no Exército

    RUBENS VALENTE
    DE BRASÍLIA

    15/05/2017 02h00 - Atualizado às 13h14
    Erramos: esse conteúdo foi alterado

    Arquivo Pessoal
    Jair Bolsonaro joga basquete com amigos da brigada paraquedista. (Foto: Arquivo pessoal) *** DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM ***
    Jair Bolsonaro joga basquete com amigos da brigada paraquedista

    Documentos obtidos pela Folha no STM (Superior Tribunal Militar) mostram que o deputado e presidenciável Jair Bolsonaro (PSC-RJ) admitiu em 1987 ter cometido atos de indisciplina e deslealdade para com os seus superiores no Exército.

    O então capitão foi acusado por cinco irregularidades e teve que a responder a um Conselho de Justificação, uma espécie de inquérito, formado por três coronéis.

    Ele foi considerado culpado pelos coronéis, mas absolvido depois em recurso acolhido pelos ministros do STM, por 8 votos a 4.

    O processo tinha dois objetos: um artigo que ele escreveu em 1986 para a revista "Veja" para pedir aumento salarial para a tropa, sem consulta aos seus superiores, e a afirmação, meses depois, pela mesma publicação, de que ele e outro oficial haviam elaborado um plano para explodir bombas-relógio em unidades militares do Rio.

    Os documentos informam que, pela autoria do artigo, Bolsonaro foi preso por 15 dias ao "ter ferido a ética, gerando clima de inquietação na organização militar" e "por ter sido indiscreto na abordagem de assuntos de caráter oficial, comprometendo a disciplina".

    Reprodução
    Fac Simile
    Registro da punição do então capitão Jair Bolsonaro pela infantaria

    O Exército detectou um movimento para desestabilizar a cadeia de comando e determinou uma investigação, a mando do ministro e general Leonidas Pires Gonçalves (1921-2015), alvo de Bolsonaro.

    Em interrogatório reservado de 1987, o então capitão assinou documento no qual reconhece ter cometido uma "transgressão disciplinar" ao escrever para "Veja". "E que, à época, não levou em consideração que seria uma deslealdade mas que, agora, acha que sim", disse ao depor.

    O STM decidiu que pelo artigo ele já havia sido punido com a prisão. Depois, a revista publicou que ele e outro capitão haviam elaborado um plano chamado "Beco sem saída", que previa uma série de explosões. Como evidência, a revista divulgou esboços atribuídos a Bolsonaro.

    Na reportagem, ele dizia que haveria "só a explosão de algumas espoletas" e explicava como fazer uma bomba-relógio. "Nosso Exército é uma vergonha nacional, e o ministro está se saindo como um segundo Pinochet", afirmava.

    Havia outros movimentos militares pelo país, como um capitão que invadiu uma prefeitura para pedir reajuste. Acuado, o então presidente José Sarney deu um aumento escalonado de 95% nos salários das Forças Armadas.

    Bolsonaro negou a autoria de qualquer plano de bombas e citou que dois exames grafotécnicos resultaram inconclusos. Perícia da Polícia Federal, porém, foi inequívoca ao concluir que as anotações eram dele.

    Os coronéis decidiram, por unanimidade, pela condenação. "O Justificante [Bolsonaro] mentiu durante todo o processo, quando negou a autoria dos esboços publicados na revista 'Veja', como comprovam os laudos periciais."

    Segundo documento assinado por três coronéis, Bolsonaro "revelou comportamento aético e incompatível com o pundonor militar e o decoro da classe, ao passar à imprensa informações sobre sua instituição".

    Pela lei, decisões do conselho deviam ser enviadas ao STM. No tribunal, Bolsonaro negou em abril de 1988 o plano das bombas, mas reconheceu a autoria do artigo: "Admito também a transgressão disciplinar [...], pela qual, acertada e justamente, fui punido com quinze dias de prisão, única punição por mim sofrida até a presente data".

    OUTRO LADO

    A assessoria do deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ) afirmou na sexta (12) que a reportagem da Folha "é idiota e imbecil" e indagou "quem estava pagando" pelo trabalho.

    A Folha pediu uma manifestação do parlamentar, mas não houve resposta até a conclusão desta edição. O assessor do parlamentar se recusou a anotar os telefones de contato do repórter.

    Segundo a assessoria, a "pauta é uma merda".

    Em resposta ao Superior Tribunal Militar em 1988, ele afirmou que escreveu o artigo para "Veja" para pedir reajuste salarial "em defesa de minha família e de minha classe, mesmo sabendo que estava ferindo o Regulamento Disciplinar do Exército".

    "Onde encontrar indignidade no artigo publicado na revista?", indagou Bolsonaro em sua defesa.

    Sobre a ideia de fazer explosões, Bolsonaro voltou a negá-la: "Nego veementemente tal plano. Como posso provar que não o conhecia? À 'Veja' cabe o ônus da prova. Baseado em que elementos chegou à absurda conclusão de que eu tinha ou sabia de um plano?"

    A respeito dos exames grafotécnicos feitos pela Polícia Federal e pela Polícia do Exército que o incriminaram, ele afirmou que havia dois outros, inconclusos.

    Segundo o então capitão, houve "gritante cerceamento do direito de defesa" no processo pelo qual o Conselho de Justificação o condenou, em janeiro de 1988.

    CRONOLOGIA

    3.set.1986
    A revista "Veja" publica artigo do então capitão Jair Bolsonaro, "O salário está baixo", em que pede aumento: "Não consigo sonhar com as necessidades mínimas que uma pessoa do meu nível cultural e social poderia almejar"

    Bolsonaro é preso por "transgressão grave". É acusado de "ter ferido a ética, gerando clima de inquietação no âmbito da organização militar" e também "por ter sido indiscreto na abordagem de assuntos de caráter oficial"

    25.out.1987
    A revista "Veja" divulga a reportagem "Pôr bombas nos quartéis, um plano na Esao", na qual afirma que Bolsonaro, lotado na Escola Superior de Aperfeiçoamento de Oficiais, e outro militar, Fábio Passos, elaboraram um plano que previa a explosão de bombas em unidades militares do Rio para pressionar seus superiores
    Segundo a reportagem, Bolsonaro teria dito que haveria "só a explosão de algumas espoletas" e explicou como construir uma bomba-relógio à base de TNT

    25.out.1987
    Bolsonaro e Passos entregam ao comando da Esao textos de próprio punho nos quais negam ter feito o plano e falado com a "Veja"

    1º.nov.1987
    "Veja" publica uma segunda reportagem, "De próprio punho", na qual traz o fac-símile de um croqui que teria sido desenhado por Bolsonaro com pontos em que as bombas seriam distribuídas. Ele nega a autoria repetidas vezes

    13.nov.1987
    Sindicância da Esao conclui que há aspectos a serem melhor investigados e sugere remessa dos autos a um Conselho de Justificação

    15.dez.1987
    Acusação diz que Bolsonaro agiu "comprometendo a disciplina e ferindo a ética militar"

    8.jan.1988
    Laudo de exame grafotécnico da Polícia Federal afirma que partiram do punho de Bolsonaro as anotações no croqui entregue pela "Veja"

    25.jan.1988
    Em sessão secreta, o Conselho de Justificação decide por unanimidade considerar Bolsonaro culpado
    "O Justificante [Bolsonaro] mentiu durante todo o processo, quando negou a autoria dos esboços publicados na revista 'Veja', como comprovam os laudos periciais do Instituto de Criminalística da Polícia Federal e do 1º Batalhão de Polícia do Exército"

    16.jun.1988
    Por 8 votos a 4, os ministros do Superior Tribunal Militar consideraram Bolsonaro "não culpado" das acusações, diz que duas perícias confirmaram a autoria e duas não a confirmaram, o que configura "na dúvida a favor do réu"
    Sobre o texto na "Veja", o STM decidiu que "o justificante assumiu total responsabilidade por seu ato, foi punido com 15 dias de prisão"

    22.dez.1988
    Segundo extrato da ficha cadastro de Bolsonaro, fornecido pelo Exército à Folha, o militar "foi excluído do serviço ativo do Exército, a contar de 22 de dezembro de 1988, passando a integrar a Reserva Remunerada".

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