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    'Projeto de Cunha evitaria fraudes', diz presidente de ONG que condena aborto

    INGRID FAGUNDEZ
    DE SÃO PAULO

    15/11/2015 02h00

    Sobre a mesa da sala de reuniões, bonecos de borracha imitam fetos humanos nas diferentes fases da gestação. De tamanhos e pesos realistas, alguns têm o dedo na boca. Maquetes, fotos, cartazes: tudo no sobrado rosa remete à maternidade.

    Fundado há 15 anos pela mestre em ciências da religião Rose Santiago, 52, o Cervi (Centro de Reestruturação para a Vida) atende mulheres que passam por uma gravidez indesejada. "Damos apoio a ela e à família, valorizando a opção pela vida", diz Rose.

    Presidente de honra da entidade, ela conta que a primeira coisa indagada às visitantes é "você sabe o que é um aborto?". "Explicamos os procedimentos. Temos vídeos."

    Uma das mais antigas do tipo na cidade, a ONG apoia o projeto de lei de autoria do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que dificultar o aborto legal.

    *

    O que achou do projeto de lei?

    Creio que seja importante, bom. Todo mundo fala que deturpou a lei nº 12.845 [sobre atendimento a vítimas de violência sexual], mas ela já estava deturpada. O projeto aumenta a responsabilidade do estuprador. [Com o exame de corpo de delito] vai fazer DNA, ir atrás, punir.

    Enquanto isso, a gravidez avança...não pode haver atraso no atendimento?

    Qual é a diferença do feto agora e do feto desenvolvido? Um amigo ginecologista conta que uma pessoa foi até ele e falou que queria abortar. Ele disse "faz assim, espera dez anos, daqui a dez anos você volta com um revólver e a gente mata seu filho". Tanto faz com quatro semanas ou com dez anos, é uma vida de qualquer forma. Outro fator de aplicação da lei é que ela evitaria fraudes.

    A fraude seria a mulher fazer aborto sem se encaixar nos critérios?

    Estupro, coisas assim. O que acontece muitas vezes é que ela vai, faz o abortamento em casa e diz "sofri estupro, então resolvi fazer em casa". Muitas vezes é por falta de conhecimento, de apoio.

    O estupro nem sempre deixa marcas visíveis. Não pode haver enganos?

    Vou dar um exemplo muito rude. [A menina] foi na balada, o menino veio e "ah, fui violentada". Nós tivemos na mídia a história de uma estudante que foi violentada e meu sobrinho, coincidentemente, era colega dessa estudante...e, "ah, ela saía com todo mundo". Como fazer exame de corpo de delito com uma menina que sai na balada com todos?

    Você cita o respeito e os direitos que o texto dá a mulher. Quais são eles?

    É um direito que a mulher precisa saber reivindicar, não brigando, [dizendo] "temos direito sobre nosso corpo", nós temos. Não precisa brigar por um direito que temos em condições normais. A mulher tem o direito de escolha, pela vida ou pela morte, aí o problema é dela.

    O projeto criminaliza o anúncio e instrução sobre meios abortivos. Isso acontece com frequência em São Paulo?

    Três anos atrás fomos proibidos de entregar folhetos nas portas dos metrôs. É aquele bem simplesinho, [que tem a frase] "seu teste deu positivo e você está negativa?". Antes disso, uma voluntária chegou aqui brava, contando que recebeu um folheto das abortistas, dizendo que, se quisesse abortar, era só fazer isso e aquilo...das feministas. Existe um comércio grande. A adolescente engravida? Tem que abortar! A gravidez veio de uma relação sexual não consentida? Tem que abortar! Gente, peraí. Veio uma adolescente aqui e a menina não sabia nem o que era estar grávida, tinha doze anos. Tem que abortar porque está grávida, e a mãe dizendo: "falei para ela não fazer isso". As coisas não poderiam correr mais naturalmente?

    Em que caso pode ser feito o aborto?

    Defendemos a vida. Ninguém tem o direito de decidir quem vai morrer. Já tivemos casos de menina de 12 anos grávidas. 'Ah, tem que abortar.' Se o corpo expelir, é porque não estava pronto. Se não expelir, está pronto. Achamos que temos direito à vida e à morte, não é assim.

    E se a mulher não quiser ser mãe?

    Dá para adoção. Simples assim. Não precisa ser mãe. Bom, vamos combinar que, a partir do momento que ela engravidou, já é mãe. Não adianta, não quer ser mãe, mas a natureza mostrou que ela está sendo mãe. Agora, não quer ser mãe, tem tantos métodos para não engravidar. A gente teve uma vez uma mulher homossexual que foi violentada e engravidou. Dissemos "se seu organismo não estiver pronto, ele vai expelir". Ela foi acompanhada. Eu disse "você, por natureza é mãe, mesmo tendo feito a opção de ser mãe". O bebê nasceu e ia para adoção, mas aí a mãe dela entrou no meio. A mãe dela ficou com o bebê e a menina foi morar com a namorada, já estava até na outra casa, mas o organismo dela era mãe.

    Dar o filho para adoção também não traz sofrimento, assim como abortar?

    Fico pensando o tamanho do egoísmo da mulher. Ela prefere matar o nascituro a ver a barriga para crescer e dar para adoção. E a agressão que ela mesmo vai sofrer. Tirar a vida é uma agressão muito grande para ela. Quando a mulher não quer ficar com a criança, ela nem vê quando a criança nasce. A criança já é separada dela, não tem o menor contato. Ela sai, se recupera e a criança vai para vara de infância e para adoção. E a gente continua dando o acompanhamento psicológico, porque para ela é muito difícil. A culpa que essa mulher carrega, você não tem noção.

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