• Comida

    Monday, 17-Jun-2024 08:50:51 -03

    Indígenas lutam por soluções sustentáveis na produção de alimentos

    DA REUTERS

    19/12/2015 02h00

    Cerca de 600 representantes de comunidades nativas ao redor do mundo recentemente se reuniram em Shilong, no nordeste da Índia, para a Terra Madre Indígena (ITM, na sigla em inglês), evento que ajuda a criar uma rede global de indígenas e ativistas.

    O evento, sob o auspício do movimento Slow Food, é realizado de quatro em quatro anos. A edição de 2015 foi feita em conjunto com a Parceria Indígena para Agrobiodiversidade e
    Soberania Alimentícia (Indigenous Partnership for Agrobiodiversity and Food Sovereignty).

    As histórias individuais dos participantes variam, mas são intimamente ligadas. Veja abaixo algumas delas.

    SOBERANIA ALIMENTÍCIA

    Chi Suwichan é um membro da tribo Karen do norte da Tailândia. Seu povo vive lá há séculos e, ainda assim, o atual governo tailandês não os reconhece como cidadãos.

    Maria Bautista Leon, do povo indígena tzeltal de Chiapas, no México, descendente dos maias, está protestando contra o aumento da monocultura e a ameaça dos alimentos geneticamente modificados em seu país.

    Winona LaDuke, uma ativista norte-americana da tribo ojibwe, vem liderando batalhas para salvar o arroz selvagem de seu povo, enquanto luta pelas reivindicações de terras tribais.

    Os focos na ITM são o meio ambiente, a biodiversidade, a soberania alimentícia e outras questões de sustentabilidade relacionadas ao modo de vida dessas comunidades, muitas sob ameaça crescente.

    Membros de 140 tribos de 58 países nos cinco continentes compareceram ao evento de cinco dias. As reuniões de abertura foram organizadas por temas como aprendendo sobre sistemas alimentares com sociedades matriarcais, construindo pontes entre o setor privado e comunidades indígenas, história oral, pastores e seus desafios e o futuro da comida.

    O príncipe britânico Charles, que tem sido há tempos um defensor desse tipo de problema, mandou uma mensagem em vídeo na inauguração.

    "No nosso mundo moderno, estamos totalmente desconectados do conhecimento indígena", disse. "A unidade essencial das coisas, refletida na natureza, se tornou perigosamente fragmentada. O mundo moderno se afastou da holística cosmologia indígena de nos ver como parte da natureza para se colocar a parte dela. Nós precisamos cuidar da Terra e ajudar a manter sua saúde e equilíbrio."

    Ele sugeriu ainda que é preciso escutar a sabedoria indígena para encontrar a direção necessária para que vivamos em harmonia com nosso planeta.

    UNINDO VOZES

    Carlo Petrini, que fundou o movimento Slow Food 30 anos atrás na Itália e depois criou a Terra Madre para reunir comunidades produtoras de alimentos de todas as partes do mundo, também falou no encontro.

    Giuseppe Cacace - 25.out.2012/AFP
    Carlo Petrini fundador do Slow Food International no Slow Food’s Salone del Gusto eTerra Madre em Turim (Itália). *** The founder of the slow food's movement Carlo Petrini, poses during the Slow Food’s Salone del Gusto and Terra Madre on October 25, 2012 in Turin. Entitled ‘Foods that change the world', the Slow Food movement's biggest international event is taking place in Turin from October 25 to 29, with hundreds of responsible small-scale food producers, chefs and experts presenting their products, knowledge and skills. AFP PHOTO / GIUSEPPE CACACE
    O italiano Carlo Petrini, fundador do Slow Food International

    "Nosso planeta está sofrendo por causa da ganância daqueles que querem roubar nossos recursos", ele começou. "Nossa comida perdeu seu valor e se tornou uma commodity para ser comprada pelo menos possível. A verdade é que 500 milhões de pequenas propriedades alimentam 70% do mundo, ainda assim, elas são as mais ameaçadas de todas. As grandes multinacionais reivindicam posse das sementes e promovem uma agricultura intensiva e geneticamente modificada, além de monoculturas que estão destruindo as vidas dessas comunidades indígenas produtoras de alimentos. Não pode existir sustentabilidade se não mudarmos esse modelo."

    Com a maioria dos delegados usando suas vestimentas de costume, o encontro foi colorido, musical e sentimental. Durante as grandes refeições comunitárias sediadas pelos chefs locais, havia tempo de sobra para as pessoas compartilharem suas histórias, problemas e soluções.

    "A história do meu povo foi escrita em canções, contos folclóricos e ao chamar as montanhas e o rios em nossa língua", disse Suwichan, um dos 500 mil karen no norte da Tailândia. "Nós usamos agricultura familiar com uma rotação de sete anos para nosso arroz e outros grãos. Mas desde que o governo declarou nossa área um parque nacional nós não temos mais permissão de praticar esse tipo de cultivo, o que nos forçou a usar fertilizantes químicos."

    "Nós vivemos em simbiose com a floresta e nos apoiávamos nela para conseguir plantas selvagens e alimentos, enquanto a protegíamos. Agora a nossa floresta foi designada como área de reserva de vida selvagem e nós não podemos mais tirar nada dela. Mas eles nunca nos consultaram sobre isso, nunca consultaram nossos ancestrais ou nossos líderes. Meus pais dizem que agora nós somos como crianças órfãs, que cada um de nós tem uma voz pequena, mas que juntos no ITM ela pode se tornar mais alta", afirmou.

    LINGUAGEM UNIVERSAL

    "Como diz Carlo Petrini, nós precisamos defender nossas plantas nativas e espécies de animais, nossos sabores e métodos, porque eles são uma linguagem universal", disse LaDuke. "Nós lutamos para resistir às patentes da agricultura industrial quando eles tentaram tomar nossas variedades indígenas. Nossa comida é pré-colonial, pré-transgênicos e pré-petróleo. Nós somos parte de um movimento para impedir o roubo de nossas sementes e terra, o roubo das nossas economias. Nós lutamos contra as políticas daqueles que tentam nos oprimir. E quanto mais próximas forem as relações entre nossas tribos, mais forte será nossa resistência."

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024