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    Análise

    Gigantesco, restaurante São Judas não mudou como o resto do país

    JOSIMAR MELO
    COLUNISTA DA FOLHA

    08/01/2016 02h03

    O restaurante São Judas Tadeu, ou Demarchi (a família de proprietários), há muito tempo era mais folclórico que gastronômico, mas sempre dono de um grande poder simbólico.

    Gigantesco, cresceu em paralelo com a intensa industrialização do ABC. Virou um programa "refinado" para as famílias dos que já foram os operários mais bem pagos do país, os da indústria automobilística de São Bernardo e região. Mais tarde passou também a sediar a elite política que teve ali seu nascedouro.

    Ao anunciar seu fechamento depois de quase 60 anos de história, seus proprietários apontam para a crise econômica como uma das causas.

    Não duvido que isso tenha ocorrido. Mas nas últimas décadas esta não é a primeira crise –o Brasil já passou por momentos de descontrole total da economia, e ainda de uma inflação galopante que corroía o poder de compra dos assalariados, como aqueles que são a base da economia da região.

    Reprodução/Facebook/saobernardodocampo.info
    Inaugurado em 1949, o prédio onde funcionava o tradicional Restaurante São Judas foi vendido pela família Demarchi. Em razão dos prejuízos acumulados, o mais antigo estabelecimento da Rota do Frango com Polenta fechou as portas para o público e tem destino incerto.
    O restaurante São Judas Tadeu, inaugurado em 1949, fechou as portas neste mês

    E o São Judas continuava firme, pronto a se beneficiar de uma era –os anos Lula– que nasceu justamente ali ao redor, com as greves metalúrgicas de 1979. Vinte anos depois, estando um desses metalúrgicos no poder, o país veria a emergência de um novo mercado consumidor, e setores como os serviços e a alimentação sendo irrigados por um novo sangue financeiro.

    Mas se o país mudou, o São Judas talvez não tenha feito o mesmo, para acompanhar o novo momento. Curiosamente, se o mesmo não ocorreu em todas as áreas da cultura, na gastronomia a era Lula correspondeu a um novo tipo de sofisticação no ramo dos restaurantes –mais no conteúdo (a cozinha) que na forma (luxo).

    A crescente autoestima do país incentivou a pesquisa de ingredientes nacionais (mais baratos que os importados), a procura por sabores autóctones, feitos por uma entusiasmada nova geração de chefs.

    Brotaram restaurantes mais informais baratos –adequados inclusive a momentos de crise– que se aproximam mais do artesanato e na cultura local.

    Isso é muito diferente de um modelo popularesco que mais se assemelha às gigantescas linhas de montagem da indústria automobilística. Para os novos tempos, muitos se reinventaram; o São Judas não se moveu. E acabou. Já o Mocotó, de origens tão populares quanto, e o Esquina Mocotó, vão muito bem, obrigado.

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