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    Minha História

    Brasileiro que lutou no Afeganistão diz como venceu ansiedade com o CrossFit

    DEPOIMENTO A
    EDUARDO OHATA
    DE SÃO PAULO

    30/08/2014 02h00

    O brasiliense Bruno Nogueira, 28, mudou-se aos 13 anos para os EUA. Quando terminou o ensino médio, decidiu se alistar no Exército americano e foi chamado para a guerra do Afeganistão. Ao voltar, sofreu com pesadelos e ansiedade. Passou a se dedicar a treinos de força e resistência, que o ajudaram no processo de reabilitação. Neste fim de semana, ele participa do Torneio CrossFit Brasil, em Barueri (SP), como um dos favoritos, após ter vencido a etapa da região Centro-Oeste, uma das mais acirradas do país

    *

    Nasci em Brasília em 1986 e morei lá até os meus 13 anos de idade. Em 1999 mudei para os Estados Unidos com a minha mãe.

    Ficamos em Nova York por três anos e depois fomos para o Estado de Connecticut, onde fiz o ensino médio. Em 2001, quando aconteceu o atentado às torres gêmeas, fiquei muito chocado. Lembro que estava na escola, me preparando para ir para Nova York em uma excursão.

    Sérgio Lima/Folhapress
    Bruno Nogueira, 28, treina CrossFit, modalidade que o ajudou a superar a ansiedade, em Brasília
    Bruno Nogueira, 28, treina CrossFit, modalidade que o ajudou a superar a ansiedade, em Brasília

    Sempre fui muito grato aos Estados Unidos, pelas oportunidades que tive lá e por tudo que aprendi no país.

    No último ano do ensino médio eu ainda não sabia o que queria fazer na faculdade, mas sabia que não conseguiria pagar por uma boa.

    Um recruta do exército americano veio na nossa escola e foi aí que tudo começou. Queria melhorar de vida e mostrar ao país minha gratidão por ter tido a oportunidade de viver e crescer lá.

    Comecei a pesquisar sobre as forças armadas americanas. E descobri que logo depois do alistamento e do treino inicial o exército custeava qualquer faculdade estadual.

    Nessa época eu também era um adolescente rebelde. Estava brigando muito com a minha mãe, ficava muito nervoso. Juntei tudo isso e decidi me alistar.

    Em outubro de 2004 me mudei para a Geórgia e comecei a primeira fase de treinamentos na equipe de infantaria do exército americano. Foram quatro meses de muita ralação. Me transformaram em outra pessoa, fiquei até mais calmo.

    Logo que voltei da Geórgia, fiz o vestibular e comecei a faculdade. Mas em outubro de 2005 recebi uma carta do meu batalhão, dizendo que em três semanas eu teria que me mudar para a Carolina do Norte para iniciar um treino intenso e me preparar para a guerra no Afeganistão.

    Eu já esperava por essa carta, mas não tão cedo. A conversa com a minha família não foi fácil, mas eles entenderam que tinha sido uma escolha minha.

    Treinamos por cinco meses na Carolina do Norte e em março de 2006 aterrissamos no Afeganistão. Servimos por 16 longos meses.

    Eu era um soldado da equipe de infantaria de ataque e resgate e "mortar man", especialista numa arma de atirar bombas aéreas de longa distância. Conduzimos mais de 150 missões de combate contra os Taleban e a Al-Qaeda. Em uma dessas, fui atingido com um RPG [bazuca] e fiquei 36 horas em coma. Perdi dois amigos, guerreiros muito próximo de todos nós.

    ANSIEDADE

    Quando voltamos, o exército nos deu seis meses de "férias" como recuperação. Mas o que eu menos queria era ficar longe da galera que estava lá comigo. Ninguém entendia. Voltei a estudar, mas os pesadelos, o medo de estar na rua, a falta de sono, a ansiedade de estar em um lugar aberto com muita gente, os cálculos de saídas de emergências em restaurantes, o alerta constante, tudo isso complicou muito minha vida.

    Não conseguia abrir a porta da frente da minha própria casa. Sempre entrava por uma porta diferente ou uma janela, investigando cada cômodo várias vezes por dia.

    Decidi procurar um recruta no meu batalhão para ser especialista em Operações Especiais. Em 2009, quando já estava em treinamento na Flórida, o meu batalhão anterior recebeu mais um chamado para voltar ao Afeganistão, e eu fui com eles.

    Achei que sabia mais ou menos como a guerra funcionava, mas dessa vez foi bem pior. Em um dos ataques, os ligamentos do meu joelho esquerdo se romperam e deslocaram meu tornozelo esquerdo. Continuei a missão por quatro dias tomando soro amarrado no meu capacete.

    Em 2010 decidi retornar aos EUA e à vida real. E então conheci o CrossFit [método de condicionamento físico desenvolvido nos EUA que treina força, resistência e equilíbrio, entre outras capacidades], que ajudou muito a minha reabilitação.

    Fiquei apaixonado pelo esporte, não só por ele ter me ajudado a voltar andar e a fortalecer meu corpo mas principalmente por ter me ajudado a voltar a ser uma pessoa normal, com pessoas normais. Sem perceber, vi que o CrossFit também me ajudou na minha adaptação à vida fora da guerra.

    Em 2012, me formei em ciências da saúde e comecei a fazer outro curso em fisiologia do exercício. Em 2014 peguei minha dispensa militar e resolvi voltar para o Brasil para viver mais perto da minha família. Já estou aqui há cinco meses. Amo a vida que vivi, mas também estou curtindo estar em um país novo para mim.

    E uma das coisas que me deixa mais feliz é poder apresentar o CrossFit para minha família e também para outros atletas do Brasil.

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