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    Tratamento permite que bebê com síndrome genética comece a falar

    RAFAEL GARCIA
    DE SÃO PAULO

    13/09/2014 01h26

    As primeiras palavras da menina Malu, de um ano, vieram na semana passada, graças a um aparelho de respiração não invasivo sem o qual ela não teria a oportunidade de aprender a falar.

    A menina tem uma doença muscular severa que afeta a respiração e deixou o hospital há 20 dias sem ter passado por traqueostomia, a abertura de orifício na traqueia para oxigenação.

    Esta é a primeira vez que um hospital paulista aplica esse protocolo a uma criança com amiotrofia muscular espinhal de tipo 1. Também conhecida como doença de Werdnig-Hoffman, a enfermidade ocorre em ao menos 1 a cada 20 mil nascimentos –prevalência alta para uma doença genética.

    Editoria de Arte/Folhapress

    Tendo recebido diagnóstico correto só aos sete meses de idade, Malu sofreu vários episódios de infecção respiratória, e ao todo passou mais de seis meses na UTI do hospital Albert Einstein.

    Em agosto, já com o pulmão limpo, Malu voltou para casa com os pais e tem usado uma máscara de respiração nasal –procedimento raramente adotado em casos de amiotrofia no mundo todo.

    Muitos hospitais preferem a traqueostomia para lidar de forma mais simples com uma limitação comum aos pacientes graves de amiotrofia: a incapacidade de tossir e expelir muco e impurezas do sistema respiratório.

    Como bebês com traqueostomia têm as vias pulmonares diretamente ligadas a um aparelho de respiração, é fácil extrair muco com uma tosse "simulada", manipulando a pressão do aparelho.

    Crianças submetidas a isso, porém, nunca se adaptam à respiração por nariz e boca e ficam com o uso das cordas vocais comprometido.

    Já as crianças que usam o aparelho não invasivo, como o de Malu, que auxilia a respiração ao aumentar a pressão do ar dentro das vias aéreas, precisam de cuidados maiores para evitar o acúmulo de muco nos pulmões. Mas, aos três anos, elas começam a usar uma "máquina de tosse" acoplada à máscara, reduzindo o risco de infecções.

    A recompensa pelo esforço é a chance de usar a voz: 80% das crianças com Werdnig-Hoffman têm a capacidade de falar, apesar de a doença comprometer toda a musculatura abaixo do pescoço.

    "Como ela é cognitivamente perfeita, poder dar a ela a chance de ela falar é tudo", diz Roberto Barros, 37, pai de Malu. "Na semana passada, ela já começou a falar mamãe e papai. Fez até manha."

    MUDANÇA DE HÁBITO

    O médico que possibilitou a Malu abrir mão da traqueostomia foi o pneumologista Joaquim Carlos Rodrigues. Para implementar o procedimento, o hospital Albert Einstein recebeu como consultor o português Miguel Gonçalves, especialista em terapia respiratória.

    No início, não é algo trivial. Para começar, a menina foi submetida a uma gastrostomia, abertura no estômago para alimentá-la diretamente por meio de um tubo. A entrada de comida pela boca abriria o risco de pedaços de comida descerem à traqueia e prejudicarem o pulmão.

    Sem a possibilidade de usar o aparelho de simulação de tosse, a única maneira de tentar evitar o acúmulo de muco é com manobras manuais de terapia respiratória e o uso de uma pequena sonda. Se há uma infecção pulmonar, a criança é entubada de novo –quantas vezes for preciso– até poder usar a "máquina de tosse".

    "O suporte respiratório não invasivo requer muito mais treinamento da parte do terapeuta", diz Gonçalves. "A verdade é que a traqueostomia é mais fácil para o terapeuta, mas não para o paciente."

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