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    Análise: É preciso olhar para todos os elos da cadeia do excesso de cesáreas

    CLÁUDIA COLLUCCI
    DE SÃO PAULO

    15/10/2014 02h00

    As propostas da ANS para incentivar os partos normais pelos planos de saúde só tocam a ponta do iceberg.

    São necessárias mudanças mais profundas para reverter a "epidemia de cesáreas", iniciada a partir da década de 1970, quando o INPS (Instituto Nacional de Previdência Social) determinou que o médico só receberia se participasse efetivamente do parto.

    Naquela época, era comum a obstetriz fazer o parto, sob supervisão do obstetra. Ele só assumia se houvesse alguma intercorrência, como ocorre até hoje em países europeus.

    Depois, com a expansão do mercado de planos de saúde, falhas na regulação permitiram que a remuneração dos dois tipos de partos fosse muito parecida. Os médicos passaram a preferir cesariana, que pode ser programada e demora um quarto do tempo do parto normal.

    Ao mesmo tempo, o aprendizado do parto normal foi perdendo força nas escolas de medicina. Hoje, até mesmo na residência em obstetrícia é mais comum o médico aprender a fazer cesárea do que parto normal.

    Fenômeno parecido acontece em muitos hospitais, que não têm equipes obstétricas completas e treinadas para fazer o parto normal. Não é incomum a gestante chegar ao hospital e não encontrar um anestesista, por exemplo.

    Também há cada vez menos maternidades e vagas na área da obstetrícia. Então, para garantir vaga em um hospital privado, o jeito mais fácil é agendar a cesárea.

    Há ainda uma cultura que se criou no país de que o mesmo médico que fez o pré-natal deva fazer o parto. Em países como Bélgica e Holanda, com altas taxas de parto normal, isso não acontece.

    Em 2009, a ANS propôs que os hospitais tivessem equipes de plantão para acompanhar as primeiras horas do trabalho de parto.

    O obstetra seria acionado só quando o nascimento estivesse próximo. Também estudava a adoção do cartão da gestante e do partograma. Nada evoluiu desde então.

    É importante que a ANS aperte o cerco contra médicos que abusam das cesáreas. Mas é desejável que olhe para os outros elos dessa cadeia que faz o país ostentar o nada honroso título de campeão mundial de cesarianas.

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