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    'Recauchutagem' de célula de defesa ajuda a combater leucemia

    GABRIEL ALVES
    ENVIADO ESPECIAL A CHICAGO

    15/06/2016 02h02

    Michael Bonert

    Uma nova e arriscada modalidade de terapia tem saltado aos olhos dos médicos como uma possível cura para alguns casos de leucemia difíceis de tratar.

    Ela envolve uma espécie de recauchutagem (fora do organismo) de células do sistema de defesa. Após a injeção das células turbinadas, o impacto na doença é notório.

    A terapia com células CAR T (com receptor antigênico quimérico) obtido taxas de sucesso que chegam a 90% em um estudos clínicos –a terapia ainda é experimental– com pacientes com leucemias linfoides crônica e aguda. Também há relativo sucesso em testes com outros tipos câncer, mas não tanto.

    As conquistas dessa modalidade de tratamento leucemia linfoide aguda, que representa cerca de 10% do total das leucemias, foi classificada como "sem precedentes" pela pesquisadora Noelle Frey, médica da Universidade da Pensilvânia (EUA).

    O problema da modalidade é a complexidade, afirma o coordenador de hematologia clínica do Centro Oncológico Antônio Ermírio de Moraes da Beneficência Portuguesa Phillip Scheinberg.

    De acordo com Scheinberg, não temos e dificilmente teríamos um protocolo de pesquisa do tipo no Brasil: "Há muito poucos locais capacitados; o tratamento de de ser feito em altas condições de limpeza".

    Para a recauchutagem, é necessária uma etapa chamada leucoferese, que remove do organismo as células brancas de defesa do sangue. O potencial impacto disso no organismo é severo: infecções "bobas", como uma virose, podem matar.

    Fora do organismo, essa células são tratadas e são transformadas, isto é, recebem um DNA exógeno. Elas são multiplicadas e passam a apresentar, em sua membrana, uma proteína quimérica, projetada para se ligar a um antígeno, no caso a molécula CD19, proteína geralmente presente nas células cancerosas.

    Mirando no CD19, a terapia com células T recauchutadas, conseguem se ligar às células-alvo e descarregar todo seu arsenal antitumoral, tratando a doença.

    No "projeto" do receptor quimérico, também constam regiões, que ficam pra dentro da célula, responsáveis por essa melhor ativação dos linfócitos e que aumentam sua sobrevivência de maneira expressiva, potencializando sua ação.

    REMÉDIO AMARGO

    O problema da terapia com as células CAR T é uma resposta inflamatória exagerada que acompanha a ação antitumoral. Essa reação pode matar, se não for controlada adequadamente.

    "Ainda temos muito o que aprender, o efeito da terapia pode ser desastroso, se ela não for bem controlada."

    Em um estudo, Noelle e colegas resolveu tentar fracionar a dose de células para ver o balanço entre eficácia e segurança (ausência da resposta inflamatória exacerbada). A dose "normal" era de 500 milhões de células, que tinha resposta em 100% dos casos e também inflamação em todos os pacientes.

    Fracionado em 3 a dose original, em 3 dias seguidos, a eficácia passou a 86% e a inflamação apareceu em 66% dos casos. Uma única dos de 50 milhões de células reduziu a eficácia para 33% e a inflamação apareceu em 66% dos casos.

    O estudo era de fase 1: pequeno, preliminar e com poucos pacientes (46). Um de seus objetivos era de ver a segurança, e foi visto que pacientes com uma forma mais branda da doença eram razoavelmente protegidos desses efeitos inflamatórios -nenhum foi afetado enquanto 44% dos que tinham versão mais grave tiveram a complicação. Os pacientes mais graves também estão mais sujeitos à toxicidade no sistema nervoso.

    A saída, afirma Scheinberg, é otimizar ainda mais o processo, além de se valer de outras moléculas para deixar o tratamento mais seguro, como o anticorpo tocilizumabe.

    A sobrevida após um ano ficou em 73% e 57% para os grupos menos e mais graves, respectivamente. Também está inversamente associada à melhor eficácia do tratamento a idade dos pacientes em tratamento.

    O trabalho foi apresentado no encontro anual da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (Asco) de 2016, que aconteceu em Chicago entre 3 e 7 de junho.

    TUMOR SÓLIDO

    A esperança dos oncologistas é levar esse "caso de sucesso" para os tumores sólidos (como de pulmão ou ovário). No entanto, apesar de a abordagem fazer sentido, não houve grande progresso.

    A saída seria mexer na estrutura desses receptores quiméricos, fazendo que eles encontrem outros marcadores, além do CD19, que possam estar presente na superfície de outras tipos de células cancerosas.

    "As células T CAR foram estudadas mais extensivamente em malignidades hematológicas (neoplasias de célula B), em que vimos resultados arrebatadores", diz o oncologista Mauro Zukim, do Grupo COI, do Rio. "No entanto, o modelo de tratamento dos tumores sólidos é mais desafiador do que as malignidades de células B com células CAR-T por causa das características da estrutura histopatológicas, escassez de antígenos específicos e forte ambiente imunossupressor desses tumores", diz.

    Já o oncologista clínico Fernando Maluf, oncologista do Hospital Albert Einstein e do Centro Oncológico Antonio Ermírio de Moraes, diz que o tratamento "é uma das formas promissoras de imunoterapia que existem para os tumores sólidos. Há dados interessantes em câncer de colo de útero –as células foram projetadas para atacar proteínas do HPV. Mesmo sendo pacientes já tratadas, metastáticas e com péssimo prognóstico, houve bons resultados".

    Também é possível combinar a "recauchutagem celular" com outras terapias que modulam o sistema imunológico, tentando criar um efeito de somação no combate ao câncer.

    O jornalista GABRIEL ALVES viajou a convite da Pfizer

    Editoria de arte/Folhapress
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