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    Virgindade perde peso, mas beleza e finanças ainda influenciam romance

    REINALDO JOSÉ LOPES
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    23/08/2016 02h00

    Ilustração Orlandeli
    Mesmo hoje, nossa escolha de parceiros ainda tem influência de pressões da seleção natural
    Mesmo hoje, nossa escolha de parceiros ainda tem influência de pressões da seleção natural

    Na era dos aplicativos de paquera e dos anticoncepcionais, será que a seleção natural ainda afeta a maneira como as pessoas escolhem seus parceiros? Ao menos em parte, a resposta é sim, revelam dois estudos assinados por pesquisadores brasileiros – embora mudanças culturais recentes também sejam capazes de afetar preferências românticas.

    Um dos trabalhos mostrou, por exemplo, que os homens ainda dão mais importância à aparência física quando buscam uma namorada, enquanto as mulheres tendem a preferir sujeitos com melhores perspectivas financeiras – uma assimetria já prevista pelas abordagens evolucionistas do comportamento humano. O outro levantamento, por sua vez, indica que a diferença tradicional de tamanho entre os sexos – ou seja, a ideia de que o homem "deve" ser mais alto que sua parceira – ainda é a regra.

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    Se os resultados parecem estereótipos do relacionamento entre homens e mulheres, é importante lembrar que, no caso do primeiro estudo, os pesquisadores também verificaram que ambos os sexos dão muito menos peso à virgindade do possível parceiro ou à sua vontade de ter filhos, diferentemente do que acontecia 30 anos atrás. Já o segundo trabalho também avaliou casais homossexuais (formados tanto por homens quanto por mulheres), verificando que, entre eles, a diferença de tamanho só é importante quando um dos membros do casal domina o relacionamento.

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    "Os dados, de certa forma, reforçam estereótipos, mas não necessariamente os justificam", argumenta André Souza, brasileiro que trabalha na Universidade do Alabama e é autor de um dos levantamentos. "Se eu fizer um estudo mostrando que beber e dirigir causa acidentes, não estou dizendo que tem de ser assim. Entender as forças que motivam nossos comportamentos deve ser o primeiro passo na tentativa de mudar ou influenciar esses comportamentos."

    DARWIN EXPLICA?

    Ambos os trabalhos adotam os pressupostos da chamada psicologia evolucionista, um ramo de pesquisa que busca usar a teoria da evolução como ferramenta para compreender a mente humana.

    O ponto de partida da ideia é simples: assim como todos os outros animais, a espécie humana foi forjada pela seleção natural, num processo que favoreceu os indivíduos com maior capacidade de sobreviver e, sobretudo, de se reproduzir. E não há nada mais crucial para a reprodução de espécies sexuadas (como a nossa) do que a escolha de parceiros. Ou seja, faz sentido esperar que esse "pedaço" do comportamento humano seja especialmente influenciado pelas pressões da seleção natural.

    Souza e seus colegas americanos David Buss e Daniel Conroy-Beam, da Universidade do Texas em Austin, decidiram comparar as preferências de parceiros de 1.186 homens e mulheres do Brasil (com idade média de 27 anos), entrevistados em 2014, com os de um grupo de 630 brasileiros e brasileiras (idade média: 22 anos) ouvidas em 1984. Os 30 anos que separam um grupo do outro são um "experimento natural" interessante, ajudando a inferir a relação entre diferenças nas respostas e possíveis mudanças culturais ao longo desse período.

    Para começo de conversa, no entanto, uma coisa não mudou: homens ainda preferem moças mais jovens, enquanto garotas ainda ficam de olho em rapazes mais velhos.

    "A pressão 'evolucionista' é a mesma para ambos os sexos: procriar da maneira mais bem-sucedida possível", resume Souza. "Um cara mais velho tem mais chances de ter um bom emprego e consequentemente mais recursos para prover. E mulheres mais novas têm mais chance de ser férteis e saudáveis."

    Esse mesmo raciocínio básico parece explicar outra constante: a atenção especial dada pelo sexo masculino à beleza, e a preocupação maior do sexo feminino com a estabilidade financeira do parceiro, diz ele.

    Por outro lado, nos anos 1980, em média, ambos os sexos viam a intenção de ter filhos como algo quase indispensável. Três décadas depois, porém, a tendência é classificar isso como algo "desejável, mas não muito importante" nas entrevistas - o que indica que as motivações ligadas à seleção natural não "controlam a mente" das pessoas, mas apenas as influenciam de maneira relativamente sutil e inconsciente.

    MAIOR É MELHOR

    Pode-se dizer que o segundo estudo é, ele próprio, fruto de uma escolha de parceiros. Dois de seus autores são a tcheca Jaroslava Varella Valentova, hoje professora do Instituto de Psicologia da USP, e seu marido, o brasileiro Marco Antonio Varella. Os dois se conheceram em congressos internacionais da área e acabam de ter seu primeiro bebê (uma menina).

    O casal e seus colegas obtiveram dados de 1.709 pessoas, de ambos os sexos e de diferentes orientações sexuais (homens e mulheres hétero, gays e lésbicas), que viviam no Brasil e na República Tcheca. Os participantes viam diagramas mostrando possíveis alturas relativas (suas e de seus parceiros) e tinham de indicar as que preferiam e as que realmente tinham em seus relacionamentos de longo prazo atuais.

    No caso dos heterossexuais, tanto as preferências quanto os parceiros reais mostraram um padrão claro: cerca de 80% dos homens namoravam ou estavam casados com mulheres mais baixas, enquanto cerca de 90% das mulheres se relacionavam com homens mais altos (os dados das preferências são bem parecidos). O tamanho maior tinha uma correlação considerável com o papel dominante do membro do casal – quanto mais alto em relação ao parceiro, mais ele tendia a estar no controle da relação.

    No caso dos casais de gays e lésbicas, a proporção de quem tinha um parceiro do mesmo tamanho ou menor era significativamente maior – mas, de novo, quanto maior a dominância do parceiro, em geral, maior era seu tamanho relativo.

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