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    Nova terapia gênica se mostra efetiva para alguns pacientes com leucemia

    DENISE GRADY
    DO "NEW YORK TIMES"

    22/11/2017 15h42

    Reprodução
    Linfócito, célula de defesa do corpo humano
    Linfócito, célula de defesa do corpo humano

    Uma nova maneira de alterar geneticamente as células de um paciente para combater o câncer ajudou pessoas que enfrentam leucemia muito grave em casos nos quais todos os demais tratamentos haviam fracassado. A nova terapia foi relatada por pesquisadores em artigo publicado na segunda-feira (20) na revista "Nature Medicine".

    A nova abordagem, ainda experimental, poderia no futuro ser aplicada de forma independente ou, mais provavelmente, tornar-se parte de tratamentos combinados, semelhantes aos "coquetéis" antivirais que combatem o HIV ou aos regimes que empregam múltiplos medicamentos na quimioterapia.

    Os pesquisadores dizem que o tratamento pode ser mais promissor como parte de uma combinação do que se usado de forma isolada, porque, ainda que alguns pacientes de um pequeno estudo tenham registrado remissões prolongadas, muitos outros apresentaram recaídas.

    A pesquisa, conduzida pelo Instituto Nacional do Câncer dos Estados Unidos, é o mais recente avanço no campo da imunoterapia, que vem registrando rápido crescimento.

    O novo trabalho tomou por base dois tratamentos anteriores aprovados este ano pela Food and Drug Administration (FDA), a agência norte-americana de fiscalização e regulamentação de alimentos e remédios: o Kymriah, produzido pela Novartis para combater a leucemia; e o Yescarta, da Kite Pharma, usado contra linfomas.

    Em alguns casos, esses dois tratamentos propiciaram longas e aparentemente miraculosas remissões para pessoas cujos prognósticos eram de morte.

    O Kymriah e o Yescarta requerem a remoção de milhões de células T do paciente –glóbulos brancos sanguíneos que combatem doenças– e sua alteração via engenharia genética para que busquem e destruam células cancerosas. As células T são em seguida transferidas de volta ao paciente, onde se alojam em uma proteína chamada CD19 encontrada em células malignas presentes na maior parte das variedades de leucemia e linfoma.

    O novo tratamento tem uma distinção importante: as células T são programadas para atacar um alvo diferente nas células cancerosas, a proteína CD22.

    Os pesquisadores estavam ávidos por testar esse tipo de célula T. Um dos motivos é que eles esperavam constatar que a CD19 não é o único alvo vulnerável, que ela não é "como um unicórnio", disse Crystal Mackall, a responsável pelo estudo, diretora associada do instituto do câncer na escola de medicina da Universidade Stanford. As células cancerosas são altamente adaptáveis e muitas vezes encontram maneiras de escapar a tratamentos direcionados a apenas um alvo.

    "A ideia de que possamos ter uma solução mágica para tudo é ingênua", ela disse.

    Outro motivo para a busca de alternativas é que alguns pacientes de leucemia ou linfoma não têm a proteína CD19 em suas células, e por isso os tratamentos existentes com células T não funcionam para eles.

    Outros pacientes, talvez 30% do total ou mais, têm a proteína CD19 inicialmente e entram em remissão quando tratados, mas perdem a proteína e sofrem recaídas depois de seis meses –um resultado muito doloroso para os pacientes e suas famílias, que desenvolvem esperanças só para vê-las frustradas.

    Em teoria, um tratamento que busque um alvo diferente poderia resgatar os pacientes que não têm a CD19 ou a percam.

    Um motivo ainda mais importante para o interesse por esse novo tipo de célula T modificada por engenharia genética é que isso permitiria aos cientistas desenvolver imunoterapias combinadas que atacariam as células cancerígenas em diversas frentes ao mesmo tempo –o que já se provou crucial para o sucesso em quimioterapias.

    A Mackall disse que um novo tratamento com células T que ataca os dois alvos ao mesmo tempo já está sendo testado em Stanford. Na semana passada, o Seattle's Children Hospital também iniciou um estudo sobre esse tratamento combinado, aplicado a crianças e jovens adultos.

    Editoria de arte/Folhapress

    "A melhor maneira seria abrir o tratamento com combinação da 19 e da 22", disse o Carl June, pioneiro no tratamento com células T na Universidade da Pensilvânia, que disse que estudaria o novo tratamento.

    "Isso pode ser o fim do jogo para a leucemia. Creio que a doença será encurralada e não veremos mais recaídas daquele tipo. Estou realmente empolgado com isso."

    O estudo publicado pela "Nature Medicine" é o primeiro a descrever um estudo sobre um tratamento direcionado à CD22 e aplicado a seres humanos. A terapia foi desenvolvida pelo Instituto Nacional do Câncer dos Estados Unidos, e Mackall disse que os pesquisadores não sabiam se uma empresa buscaria levá-lo ao mercado.

    Os pacientes envolvidos eram 21 crianças e adultos dos sete aos 30 anos de idade, com leucemia linfoblástica aguda de células B, que haviam esgotado todas as demais opções de tratamento. Muitos já haviam sido tratados com células T direcionadas à proteína CD19 e sofreram recaídas.

    Todos haviam recebido pelo menos um transplante de medula óssea, um tratamento difícil com diversos efeitos colaterais severos.

    Doses diferentes de células T foram testadas. Com a dose mais baixa, um em cada seis pacientes entrou em remissão total, o que significa que todos os sinais de leucemia desapareceram.

    Com uma dosagem mais alta, 11 dos 15 pacientes restantes –73%– registraram remissões completas, que duraram em média seis meses. Três ainda estão em remissão, seis, nove e 21 meses depois de terem sido tratados.

    Os resultados, dizem os pesquisadores, são comparáveis aos obtidos usando células T direcionadas à CD19.

    O estudo é o primeiro a demonstrar que pacientes que receberam tratamento direcionado à CD19 anteriormente podem ser resgatados mais tarde por meio de um tratamento diferente com células T, disse Terry J. Fry, do Instituto Nacional do Câncer, primeiro autor do estudo.

    "Temos um regime potente de salvação", ele afirmou.

    O estudo pode tratar mais 50 a 60 pacientes. Há uma lista de espera para adesão, disse Fry. "Não resta outra opção aos pacientes."

    Mas embora alguns pacientes registrem remissões longas, para outros a incidência de recaídas é alta. Uma descoberta preocupante, disse Mackall, foi a de que as células cancerígenas não perdiam todas as suas moléculas de CD22, mas apenas algumas, para escapar às células T. Depois de recaídas, alguns dos pacientes morreram, afirmou Fry.

    "Na oncologia pediátrica, uma remissão de três meses é ótima mas não é o resultado que buscamos", ele disse. "Queremos curar pacientes. Como melhorar o que já foi demonstrado como terapia efetiva?"

    "O conceito do tratamento de câncer é combinar múltiplos tipos de terapia. Isso abre a porta para que tentemos usar múltiplos alvos, a fim de tentar reduzir a resistência."

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

    Edição impressa
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